Internado em hospital de Cuiabá, jornalista é visitado pela morte
Pelo título acima, muita gente haverá de duvidar, catalogando tal fato como mais um dos meus ‘causos’ fantasmagóricos. Mas realmente aconteceu, duvide quem quiser. Enquadro-me entre os poucos que lograram acreditar nessa arrepiante história vivenciada pelo nobre repórter-fotográfico Demóstenes MILHOMEM, hoje aposentado.
Segundo sua narrativa, feita em tom sério, tudo aconteceu da forma mais natural possível, no auge da COVID-19; doença que o prostrou, sendo internado às pressas. Resultado: ficou de quarentena, isolado por mais de 30 dias. A internação teve lugar no antigo Hospital Jardim Cuiabá, atual Complexo Hospitalar.
Vamos ao seu encontro, digamos assim, com a Dona Morte…
Em face da gravidade clínica do caso, recorda, os médicos insistiram para que ele fosse intubado, procedimento recusado veementemente. O jornalista sabia que, a partir disso, voltar à vida [se voltasse] seria bem complicado. Já testemunhara um sem número de óbitos, pós-intubação.
No hospital, recorda, o mais desconfortável era não ter nada para fazer, limitando-se a ver TV ou telefonar para a família. A reclusão no quarto realmente incomodava, e ele não via a hora de sair dali para retomar as atividades corriqueiras de sua vida. Morria de saudades das filhas, neta, esposa e da bela chácara no Pedra 90, seu ponto de refúgio semanal.
Num começo de noite, quando estava quase cochilando, à espera do jantar, eis que entrou mansamente no quarto uma mulher muito alta, vestida elegantemente de preto. Ele estranhou aquela figura estar ali, muito chamativa em cada movimento. “Cruz credo!”, pensou, limitando-se a observá-la em silêncio.
A mulher empreendeu duas voltas ao redor do seu leito, atitude típica de cobra prestes a dar o bote. E então disse com voz gelada, impessoal: “Prepare-se: vim te buscar! Sou a Morte!”
Ao ouvir aquilo, Demóstenes deu um salto nervoso da cama, e por pouco não se estatelou no chão, desequilibrando-se por completo. “Que mulher esquisita, sô!” – pensou ao correr direto rumo à porta de acesso ao corredor. Queria pedir ajudar, supondo que fosse uma louca qualquer que invadira o hospital.
Ele gritou alto pela enfermeira, e sua voz de súplica emergencial se perdeu no silêncio da tarde que virava noite. O jornalista temia que a pavorosa mulher o agarrasse por trás e o ferisse. Sempre lembrando que estava ainda muito debilitado, sem forças físicas.
Para sua surpresa, a mulher já surgiu mais adiante no corredor, olhando-o sério por uns segundos, antes de virar seu corpão e empreender passos altivos, quase flutuantes. Assim desapareceu diante dos seus olhos…
Naquele instante, ele teve convicção de que a danada não mentira: era mesmo a Morte. Somente isso poderia explicar a mágica de ter saído do quarto sem passar pela porta, em que ele se aboletara com pernas bambas.
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Tal narrativa me fez lembrar de um amigo pescador do meu pai, que sempre chamava pela Morte. Se tinha algum tipo de dor, pedia que a Morte o levasse; se brigava com alguém, novamente recorria à Morte para solucionar sua pendenga. A Morte passou a ser sua referência de socorro pra tudo.
“Uma noite, enquanto estávamos pescando no Rio Verde Grande, ele se impacientou ao desembaraçar as redes armadas no poço fundo. Apesar de estar a mais de 50 metros, dava para ouvir nitidamente seus resmungos, droga pra cá e droga pra ali”, contava meu pai.
Ao pisar numa pedra afiada e cortar o pé, o homem esbravejou feio:
“Ah, Morte! Quer me pegar, é?!” – palavras raivosas, ouvidas por todos no acampamento.
Na sequência, os amigos do pescador chamador da Morte escutaram gritos de puro pavor, seguindo-se outros de dor. Ouviram também muito barulho de mata farfalhando, como se rasgasse o peito entre a vegetação selvagem. Os gritos não cessavam, principalmente de “Pare, pare!”, ou “Não quero, não, não quero, não!”
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Meu pai disse que o sujeito chegou borrado de merda na prainha onde armaram acampamento, chorando que nem criança de colo.
– Além de ter borrado as calças, estava sangrando no rosto e braços. Ele jurou que teve um encontro com a Morte, e ela disse irritada:
– Já cansei de ouvir você me chamando! Da próxima, vai comigo! Por ora, tome umas bordoadas para aprender!”
Pela descrição feita pelo apavorado pescador, tratava-se de uma bela mulher, não essa caveira que comumente dizem ser a Morte.
“À parte de sua beleza, possuía garras de dragão, força terrível. Zeca contou que foi lançado por ela no barranco, momento em que aproveitou para sumir da área do Poço Fundo. Nunca mais quis voltar a pescar ali, dizendo ser lugar proibido”, palavras irônicas do meu velho.
Ele acrescentou ter voltado ao mesmo lugar várias vezes, armando e retirando as redes sem problemas no Poço Fundo.
“Só não desafio nada misterioso, e nunca chamei ninguém ao entrar no poço. É preciso respeitar também coisas que a gente não entende. Quem desobedecer, pode ter surpresas ruins”, aconselhava aos ouvintes.
POR JCQ
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