A expressão era do gelo, ou idade do gelo, período glacial ou era glacialdesigna um período geológico de longa duração de diminuição da temperatura na superfície e atmosfera terrestres. Nela se verifica uma expansão dos mantos de gelo continentais e polares, como também dos glaciares alpinos. No decorrer de um período glacial de longa duração ocorrem períodos com clima extra-frio, conhecidos por glaciações. Em termos glaciológicos, o termo era do gelo mostra extensos mantos de gelo em ambos os hemisférios, norte e sul. A Terra ainda se encontra numa era glacial, uma vez presentes os mantos de gelo da Groelândia e da Antártida.
Era do gelo diz respeito ao mais recente período de frio extremo, com extensos mantos de gelo sobre a América do Norte e Eurásia. O último máximo glacial se deu há cerca de 16 mil/20 mil anos, ocasião em que enorme área onde hoje estão Nova York,Boston, Montreal e Vancover, na América do Norte, estava totalmente coberta de gelo, o qual se estendia por grande parte da Europa e o norte da Ásia.Na Suécia, a última glaciação se deu há 9.000 anos, e na região sul de Ontário, há 13.500 anos.
Por ocasião de maior recrudescimento verificado quando do final da glaciação de Würm, entre 16.000 a.C. e 11.000 a.C., o homem asiático, ou mongoloide (Homo sapiens primitivo), atingiu a América do Norte pelo Esteito de Bhering. Regredindo então o fenômeno, há cerca de 10.000 a.C., passando o continente americando a tropicalizar-se vagamente, esses asiáticos caçadores já tinham se espalhado pelo planalto, Centro, norte e Sul, formando-se na Amazônia, ainda desabitada, sua floresta tropical que persiste até presentemente.
A propósito, “Luzia” não passou de um blefe, ou mesmo uma fraude científica, a manipulação de um crânio do homem pré-histórico de Lagoa Santa, por imagens computadorizadas, dando-ocomo um tipo negroide, isto agora, em pleno Terceiro Milênio.
A população primeva de lagossantenses sempre foi estudada e respeitada nos meios científicos como de ascendência asiática, o que sempre subsistiu desde os tempos do seu descobridor, o naturalista dinamarquês Peter Lund, isto ainda no século XIX.
Cientistas norte-americanos viam a deturpação por computadores do tipo morfológico uniformede um asiático para negroide com bastante reserva. O restabelecimento da verdade veio depois com uma nova reconstituição da face do nosso primeiro ameríndio, além de exames de DNA em fragmentos do crânio de “Luzia”, quando tudo voltou ao status quo ante: eram todos mongoloides (asiáticos).
A fraude mais conhecida envolveu o “Homem de Piltdown”, em 1912, quando se teria achado na cidade inglesa de Piltdown o crânio do “elo perdido” na evolução de supostos macacos para o homem. Somente 40 anos depois, percebeu-se que aquele crânio de Piltdown, então escondido dos pesquisadores, não passava de um embuste visivelmente grosseiro. Ele não passava de um crânio humano moderno com uma mandíbula de orangotango. Somente em 1983 chegou-se ao provável responsável pela fraude. Seria sirArthur Conan Doyle, autor de romances policiais.
Sítios arqueológicos entre 12 mil e 7/8 mil anos multiplicam-se. Na hoje chamada região arqueológica de Lagoa Santa, o que se constatou foi a presença de uma população homogeneamente de origem asiática, denominada de “homem de Lagoa Santa”, inclusive na Lapa Pintada, na parte setentrional de Minas Gerais (Montes Claros).
Há dados de uma população mais recente e de características diferentes em Januária, Itacarambi e Montalvânia, porém, de tempos mais recentes, com o achado de dois esqueletos humanos e silos para guardar mandioca, milho, feijão, urucum, coquinho e até folhas de fumo para secagem.
Saliente-se mais que as glaciações e perídos interglaciais sempre acompanharam a Terra, mesmo antes do aparecimento de mamíferos, como nós, surgindo nela ciclicamente. Registre-se, de passagem, que quase 50 teorias tentam explicar a ocorrência cíclica de tal fenômendo em nosso planeta.
Possivelmente entre 750 e 580 milhões de anos atrás, este planeta esteve completamente congelado.Calcários formados naquele período comprovam sua formação em águas bastante geladas, sendo que os minerais apresentaram falta de oxigênio, condição climática glacial responsável pela extinção de quase toda forma de vida de então. A fronteira entre o Permiano e o Triássico registra a maior extinção em massa verificada na Terra, com 95 por cento das espécies dizimadas.
A segunda maior extinção em massa da histórica física da Terra se deu há 450/440 milhões de anos. Durante o Período Ordoviciano (compreendido entre 488 a 443 milhões de anos, sucedendo o Cambriano e precedendo o Siluriano), mais de 75 por cento das espécies marinhas desapareceram coincidindo com um período glacial, ocasião em que as temperaturas diminuíram e as geleiras dominaram a paisagem.
O estudo do paleoclima se mostra difícil para aquilatar as mudanças na temperatura dos oceanos e nos blocos de gelo continental, mas o somatório de tudo é importante para explicar a extinção em massa, uma vez que, com mais água congelada, o nível do mar diminui, reduzindo o habitat marinho.
O período Carbonífero terminou com uma era do gelo que atingiu a maior parte do hemisfério sul. E no início do Permiano, o mesmo hemisfério sul ainda permanecia tomado pela mesma era do gelo. Quando esta terminou, os continentes foram dominados por um período desértico, com florestas virando desertos.
Seth Finnegan, da equipe de pesquisadores liderada pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), principal autor de artigo publicado na edição on-line da revista especializada “Science”, tratou da relação de mudanças climáticas com extinção de organismos vivos:
“Descobrimos que taxas elevadas de mudanças climáticas coincidem com a extinção… Mas, na época das glaciações, os termômetros baixaram cinco graus, fazendo com que as geleiras crescessem no continente Gondwana mais de 150 milhões de quilômetros cúbicos – um tamanho maior do que as geleiras que cobriam a Antártida e o Hemisfério Norte durante a última glaciação da era moderna, há cerca de 20 mil anos. Nosso estudo fortalece a ideia de que a mudança climática foi responsável pela extinção.”
Esclareça-se que Gondwana era a porção sul da Pangeia, cuja parte norte ficou conhecida como Laurásia. Com o movimento continuo de suas placas, Gondwana chegou ao que temos hoje: a América do Sul separada da África; a Índia se juntou a Ásia; e Oceania se tornou um continente cheio de ilhas, com a Austrália sendo uma porção bem distinta. A Antártida se isolou no polo sul, ali se encontrando até hoje.
Outra extinção em massa por força de mudança climática se deu há 50 mil anos, quando os grandes mamíferos praticamente foram desaparecendo da Terra. Bisões, cavalos selvagens, mamutes, rinocerontes lanosos, renas e bois almiscarados, animais comuns na América do Norte e Eurásia (continente que reunia as atuais Europa e Ásia), começaram a declinar entre 36 a 72 por cento. Foi quando tivemos a última era do gelo, durante o Pleistoceno, que durou de 2 milhões a 12 mil anos atrás.
Foi em um período glacial que apareceu o Homo sapiens neanderthalensis, entre 100 mil e 40 mil anos atrás, ocupando pequena faixa do Velho Mundo, entre a Europa Ocidental e Oriente Médio, região geográfica em que seus traços biológicos se mostram de forma incontestável, como no “velho” de La Chapelle-aux-Saints. Seu primeiro esqueleto foi encontrado numa caverna do Vale de Neander, na Alemanha, em 1856.
Era estupendamente especializado para ocupar regiões geladas de sua respectiva era glacial. Entre meados e o declínio propriamente dito do fenômeno, ele ainda se miscigenou com outros tipos humanos, desaparecendo então.
Mas deixou em praticamente toda a atual população mundial alta carga de seus genes, como foi comprovado por estudos recentes usando DNA antigo e a sequenciação do genoma do Neanderthal. Assim se comprovaram variantes genéticas semelhantes aos neandertaisem populações atuais de europeus e asiáticos.
Acresce notar que inúmeros fósseis humanos classificados como Homo erectus ou Homo sapiens primitivo (Homo sapiens neanderthalensis)acabaram sendo considerados formas transicionais entre as duas espécies. O Homem da Rodésia, tido a princípio como um “neandertal tropical”, acabou classificado como forma de transição generalizada. Na melhor vertente neandertalense estão os homens de Steinheim e Swanscombe.
O homem de Cro-Magnon, que foi o Homo sapiens mais antigo, também enfrentou o mesmo período glacial, convivendo com animais,agora extintos, como mamutes, leãodas cavernas e cervos gigantes, entre outros.Acredita-se que os frequentes combates dele com os neandetais é que levou os últimos ao desaparecimento.
O que é hoje a América do Sul, na qual está o território brasileiro, passou por diversos efeitos decorrentes da ascensão e recuo do nível do mar. As geleiras são parte integrante desse ciclo da água, registrando as condições climáticas globais ou localizadas dos continentes respectivos.
O território brasileiro guarda testemunhos de diferentes glaciações, algumas delas ocorridas há milhares de anos, e outras, há milhões de anos. Entre as mesmas, sendo umas mais duradoras e outras menos, tivemos algumas de abrangência mundial e outras, limitadas a certas regiões do atual território brasileiro.
Tilito é o nome dado à rocha endurecida que teve origem no acúmulo dos detritos levados por uma geleira, e, tratando-se de rocha ainda não consolidada, formada recentemente, o nome que recebe é till. No verão, ou na época mais apropriada para o degelo, há enorme sedimentação de grãos sílticos. A este sedimento rítmico consolidado tem-se a designação do varvito.
Em Itu, Estado de São Paulo, o varvito tem exploração para pavimentação, sendo vulgarmente conhecido por laje de Itu. O varvito é encontradofrequentemente associado a seixos glaciais, estes originados da fusão de blocos de gelo que boiavam sobre os lagos onde se sedimentava o varvito.
Rochas moutonnés, de origem glacial, são registros típicos da erosão glacial, ocorrendo entre os atuais municípios de Salto e Itu, em São Paulo, conhecendo-se apenas outra, de mesma idade, na Austrália.Há cerca de 250 milhões de anos, o Sul-Sudeste da América do Sul possuía amplas geleiras, estendendo-se a outras áreas do globo, que deram origem a tais rochas moutonnés.Vimos essa ocorrência em Salto. Existe nesse município paulista o Parque da Rocha Moutonné, em antiga pedreira de varvito, rocha sedimentar que, refrisando, é de origem glacial.
“Descobrir os vestígios dessas ocorrências, descrevê-los e caracterizá-los constituem uma especialidade dos estudos geológicos e da tectônia. E as teses defendidas pelos pesquisadores nem sempre são concordantes nas suas conclusões. O que vem trazer uma nova pitada de mistério neste aspecto da história da Terra”, conforme Afonso José de Almeida-Manso, em seu trabalho “O Jequitaí das Geleiras” (parte integrante da coletânea “Geleiras, flores e velhos caminhos”, BN/EDA/DF, 2011, nº 234).
O autor acrescenta, trazendo à baila um desses fenômenos no atual setentrião mineiro, em lugares que visitamos com frequência há anos, em observações de conglomerados diversos de origem glacial remontando ao Pré-Cambiano Superior:
“O vale do rio Jequitaí, situado na região central de Minas Gerais, guarda significativos testemunhos de uma glaciação ocorrida há milhões de anos, conforme estudos publicados por cientistas de universidades… Segundo alguns pesquisadores, tal fenônemo teve lugar durante o intervalo sturtiano da idade proterozoica, há mais de 700 milhões de anos. Ou seja, durante o denominado ciclo brasileiro, que se estendera entre 1.050 milhões e 450 milhões de anos atrás.”
“E, cabe lembrar, esse ciclo constituiu fase essencial do processo de formação da placa tectônica que veio a dar origem ao atual continente sul-americano. Uma longa história, portanto. Assim, não deixa de ser admirável que, ainda hoje, marcas, testemunhos, ícones daquele fenômeno climático possam ser constatados e facilmente observados nos terrenos dos municípios de Jequitaí e Francisco Dumont.”
Condições climáticas e deposicionais do Meso/Neoproterozoico da borda oeste do cráton São Francisco revelam registro de destaque na Formação Jequitaí, situada na base do Grupo Bambuí. Em tal formação, na região do município de Vila Boa, existe uma ocorrência que se mostra em contato dissonante nas diversificadas unidades que compõem o Grupo Paranoá, com descontinuidade lateral. Estudos demonstraram uma sequência basal de camadas métricas de arenito e grauvacas sobrepostas por uma camada decamétrica de diamictito maciço, seguindo-se uma camada métrica de arenito calcífero.
A observação sedimentar sugere a existência de depósitos glaciogênicos assim mantidos em paleovales, os quais,preteritamente, passaram por rápidas inundações posteriormente à sua deposição. Panorama assim indica o registro de geleiras terminais ainda em condições continentais erodindo o Grupo Paranoá anteriormente à geração do Grupo Bambuí. Os registros petrográficos dessas rochas psefíticas vêm mostrar diamictitosressedimentados e possíveis tilitos localizados.
São as conclusões do referido estudo e outros desses vestígios de uma glaciação que, nos primórdios da Terra, tingiu do branco das geleiras (como vemos hoje nos glaciares polares e alpinos) Jequitaí, Claro dos Poções (no seu distrito de Água Boa, sentido Triângulo Mineiro) e Francisco Dumont. O corte de um morro, na Serra das Porteiras, quando das obras de construção da BR-365 (Triângulo Mineiro – Montes Claros), em Minas Gerais, é que trouxe à baila enorme formação rochosa cristalina, sob a forma de uma lente oval, esta, na verdade, retratando uma seção da formação rochosa que aí se estenderia por centenas de metros de comprimento.
“Esse mesmo estudo aponta que junto ao Km 66 daquela rodovia (ou seja, a cerca de 30 quilômetros ao norte do acesso a Jequitaí), uma pedreira, ora desativada, fornece outro bom exemplo do diamictito formado pelas geleiras. Nesse local, o diamictito apresenta-se com aparência muito homogênea, de rocha muito endurecida, exibindo uma matriz cinza onde se espalham incrustações de pequenos clastos avermelhados” (Afonso José de Almeida-Manso, estudo citado).
“Passando a ponte da MG-208 sobre o rio, à saída de Jequitaí para Francisco Dumont” – continua – “o viajante irá observar que o corte no morro, feito para dar passagem à rodovia, trouxe à mostra a constituição rochosa dessa elevação, o diamictito. Tratam-se de clastos, bolderes e seixos de constituição rochosa ou mineral variada, inseridos, em maior ou menor abundância, numa matriz feita de argila, silte e areia, tendo sido, toda essa massa, submetida ao peso e à ação da geleira que aí se assentava. Esse diamictito formara-se, portanto, na base da geleira. Em termos figurados, constitui-se a partir de massa barrenta e pedregosa que se encontrava à superfície, ou que então fora erodida, ou, ainda, que fora raspada do embasamento rochoso pré-existente e comprimida e empurrada pela imensidão de gelo que a tudo cobria.”
“Diamictito (sin. tiloide = semelhante atill). (Conf. Paraconglomerado). Rocha conglomerática, com fragmentos grandes imersos e dispersos em abundante matriz lamítica, síltico-argilosa, lembrando um tilito (tiloide), não ou mal classificada, não ou mal estratificada, siliclástica geralmente. O termo, usado por alguns autores como sinônimo de paraconglomerado, não tem implicação genética direta, aplicando-se a rochas de várias origens tais como tilitos (glaciais), paraconclomeradosperiglaciais, olistostromas (associados a deslizamentos e correntes de turbidez, por exemplo, lamitoconglomeráticoelúvio-coluvional, lamitoconglomerático de deslizamentos gravitacionais em áreas vulcânicas)”, conforme M. Winge (home page “Glossário Geológico”).
Diamictito é termo cunhado em 1960 para rochas pobremente selecionadas ou laminadas, sendo o termo puramente descritivo, sem conotação genética. Tem aplicação a rochas diversas, como, por exemplo, o tilito glacial.
Em que pese as referências aqui já feitas à Glaciação Jequitaí como base do Grupo Bambuí, em seu trabalho “Estratigrafia e Tectônica do Grupo Bambuí no Norte do Estado de Minas Gerais”, dissertação de mestrado (UFMG/Instituto de Geociências/Programa de Pós-graduação em Geologia), o autor Mário Iglésias Martínez, com orientação de Alexandre Uhlein, considera que aquela glaciação pretérita registrada no que é hoje o setentrião mineiro deveria ser vista como unidade em separado e discordante em relação ao Bambuí. Registrou:
“Couto e Bez (1978) discutiram a problemática da Glaciação Jequitaí e a sua inserção como base do Grupo Bambuí. Concluíram que a formação portadora de tilitos deveria ser considerada como uma unidade em separado, discordante em relação ao Grupo Bambuí. Na base do grupo ficariam apenas os conglomerados descontínuos e de pequena espessura, como o conglomerado Carrancas. Os tilitosJequitaí passaram a pertencer ao grupo Macaúbas. Assim, esses autores confirmaram as observações de Oliveira (1967), que, baseado em critérios estratigráficos e paleoclimáticos, considerou a formação Jequitaí como unidade discordante em relação ao Grupo Bambuí. No presente trabalho tem-se optado pela exclusão da Fm. Jequitaí do Grupo Bambuí tomando em consideração esses mesmos argumentos.”
Referido trabalho, porém, traz abaixo uma tabela conforme Dardenne (in Lima, 2005), mostrando a divisão litoestratigráfica do Grupo Bambuí, ali constando a Formação Jequitaí, ao lado de outras cinco, como sendo de ambiente de sedimentação glacial, tendo como características litológicas paraconglomerado com matriz argilosa esverdeada e seixos de quartzitos, calcários, dolomitos, cherts, gnaisses, micaxistos, granitos e rochas vulcânicas.
Enfim, segundo J. G. Parenti Couto e LauriBez (in “A Glaciação Jequitaí: um Guia Estratigráfico para o Pré-Cambriano Superior no Brasil”, texto publicado na “Revista Brasileira de Geociências”, volume 11, 1981):
“A propriedade em se definir como “Glaciação Jequitaí” o fenômeno climático ocorrido no Brasil, no Pré-Cambriano Superior, deve-se em primeiro lugar à primazia da sugestão de Branner; em segundo, por situarem-se na região de Jequitaí as provas mais convincentes dessa glaciação e, finalmente, por possibilitar, mais do que em quaisquer outros lugares, condições para se precisar o real posicionamento de tal período com base em novos dados geocronológicos do Grupo Bambuí (Couto, et al., op. cit.).”
“Os dados concretos sobre essa glaciação devem-se a Isottaet. al., que, em 1969, apresentaram provas convincentes de uma origem glacial para os conglomerados de Jequitaí, conforme assinala Hettich (op.cit.), que acrescenta, com ampla documentação, novas provas em favor dessa concepção. Assim, a região que bordeja a Serra do Curral e se estende até pouco ao norte da localidade de Jequitaí, localizada na parte central de Minas Gerais, situa-se como o local onde mais se acumularam provas de uma origem glacial para os inúmeros conglomerados do Pré-Cambriano Superior, tidos como de origem glacial, que ocorrem espalhados pelos Estados de Minas Gerais, Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.”
“A idade dessa glaciação situar-se-ia, portanto, entre 640 milhões de anos (idade da base do Grupo Bambuí que se sobrepõe aos tilitos em Jequitaí) e 950 milhões de anos-1 bilhão e 350 milhões de anos (idade dos estromatólitos que se sobrepõem aos tilitos em Couto Magalhães).”
Registros de geleiras atuais do hemisfério norte revelam a formação de rochas pela atividade erosiva de rios subterrâneos. Estes correm sob as geleiras, em temperaturas diferentes, sendo que com a erosão da superfície são misturados os mais variados minerais, barro e areia, com o que novas rochas se originam.
Geleira, em outras palavras, é uma grande e espessa massa de gelo formada em camadas sucessivas de neve compacta e recristalizada, de várias épocas, em locais nos quais o acúmulo de neve é superior ao degelo, provocando erosão e sedimentação glacial.
Mister esclarecer que entre as características geológicas decorrentes das geleiras estão as morenas, ou moreias, terminais ou frontais, mediais, de fundo ou as laterais, que são cristas ou depósitos de fragmentos de rocha transportados pela expansão do gelo.
A presença de registros dessa vetusta geleiraem Jequitaí e redondezas nos dá uma noção desse interessante fenômeno. A mencionada pedreira desativada em Jequitaí, junto ao km 66 da rodovia, fornece ótimo exemplo do diamictito formado pela referida glaciação: uma rocha homogênea e endurecida, de cor cinza e na qual se espalham incrustações de pequenos clastos avermelhados.
Visitamos uma pequena caverna em Coração de Jesus, no Norte de Minas Gerais, em meados de 2018 e fevereiro de 2019, município em que predomina o calcário.
De antemão, esclareça-se que o nosso calcário é uma rocha sedimentar do Grupo Bambuí da Formação Sete Lagoas, datado do Pré-Cambriano Superior, no caso restringindo-se a 600 milhões de anos.
O Pré-Cambriano é a mais antiga e longa das eras geológicas, estendendo-se desde a formação da Terra, há 4,5 bilhões de anos, até 570 milhões de anos atrás.
O grupo Bambuí ocupa quase 1/3 de Minas Gerais e detém importantes recursos minerais, como zinco, chumbo, fosfato, ardósia, fluorita, calcário (predominância de mais de 30% de carbonato de cálcio), calcário dolomítico (quando o mineral nele predominante é a dolomita), etc. A época de deposição do Grupo Bambuí é atribuída ao final do Pré-Cambriano.
A Formação Sete Lagoas, que tem enorme predominância sobre a Formação Bebedouro (também do Pré-Cambriano Superior), é tão grande que se torna praticamente a única representante do Grupo Bambuí. Essa rocha sedimentar estende-se do karts de Lagoa Santa rumo ao Norte de Minas Gerais e Sul da Bahia.
No entanto, tal caverna, descoberta por Ubirajara Macedo e que batizamos de Caverna Glacial, é sui generis,porque formada por depósitos glaciogênicos em um paleovale, após cujas deposições ela sofreu rápidas inundações, o que denota ali uma geleira terminal.
Ou seja, há registros no local de depósitos glaciogênicosem um paleovale, que passou por uma ou mais inundações após ditas deposições. A origem e idade dessa caverna sui generis,ao que tudo indica, estãoentrelaçadas com o final da GlaciaçãoJequitaí (geleira terminal).
O recuo das geleiras fez surgir um provável ambiente marinho, como se comprova pelas marcas de onda (riplles) encontradiças em Jequitaí e circunvizinhanças, coincidindo com o início da formação propriamente dita dos maciços calcários do Grupo Bambuí, há 600 milhões de anos.
Ainda em Coração de Jesus, não muito distante da entrada da Caverna Glacial, quando muito 300 metros andando por esse mundo subterrâneo, alcançamos uma formação geológica de natureza totalmente diversa.
Isto é, deixando para trás aquelas paredes e tetos deposicionais, como quem vira uma página de um livro, chegamos a corredores e tetos inteiramente calcários, porém pobres em espeleotemas, havendo ainda uma claraboia (saída para o mundo exterior pelo teto).
Na verdade, são duas cavernas entrelaçadas e de naturezas distintas. A da entrada, formada no final da Glaciação Jequitaí,antecede em idade (640 milhões de anos ou pouco mais) a subsequente (pouco menos de 600 m.a.). Esta última é cerca de 2/3 maior, sendo constituída de rochas carbonáticas da Formação Sete Lagoas do Grupo Bambuí. Existe um riacho que, cortando ambas, chega ao mundo exterior pela boca da Caverna Glacial (ressurgência).
A exemplo da diversidade de rochas raspadas pela ação erosiva de rios subterrâneos sob as geleiras do hemisfério norte, a cavidade ora tratada é algo similar ao mesmo fenômeno, o que é possível concluir pela diversidade mineral arrancada e agregada àquilo que parece ter sido uma fenda na parte mais profunda de um paleovale, talvez então um mar interior raso decorrente da geleira terminal.
Estão presentes nesse conglomerado sedimentar pequenos componentes arredondados, predominando seixos calcários (também registrados na Formação Jequitaí), seixos polidos de rochas diversas, também pouco quartzo hialino, algo parecendo argila endurecida e outros minúsculos minerais enegrecidos, escorrimentos no teto daquilo que na época foi um líquido cor de ouro muito brilhante, além de uma concha parcialmente recoberta de calcário, tudo ligado por materialaluvionar.
A propósito de ouro, palavra a que nos referimos acima, estivemos mais uma vez na cidade de Jequitaí, nos dias 09 e 10 de agosto de 2019, quando ganhamos de presente do amigo, conterrâneo e ex-colega de escola, Edaílson Cordeiro, no segundo dia, um fragmento de diamictito com uma profusão de ouro em pó agregado.
O pedaço da citada rocha conglomerática com aquele metal brilhante nela grudado foi encontrado em Jequitaí mesmo, algum tempo antes, por um garimpeiro, que erroneamente pensou tratar-se de uma rocha de granito. Imediatamente associamos esse achado com o líquido cor de ouro que observamos na Caverna Glacial de Coração de Jesus, município que não é aurífero.
E, pela manhã do segundo dia aquele passeio, nadando no Rio Jequitaí, que é dominado pelo diamictito, coletei na margem esquerda deste manancial uma inclusão de quartzos hialinos em tapanhoacanga, ou canga, esta uma concreção ferruginosa misturada com argila e areia, inteiramente imprestável à extração de ferro. Essa canga não existe nos diamictitos de Jequitaí, mas é extremamente comum em Coração de Jesus.
Tais achados seriam, com certeza, um elo da era do gelo entre as duas localidades, Jequitaí e Coração de Jesus.
Já a concha,alongada, assimétrica e côncava, com uns cinco centímetros, na qual se percebe nitidamente seu revestimento por uma “nata” calcária – ou seja, um calcário ainda líquidooriginariamente, o que presentaria seu estágio de formação, envolvendo o outro corpo e nele endurecendo como se fosse uma pintura minúscula -, foi ligada ao mundo marinhopelo físico, professor e entendedor de moluscos, o nisseiShigueo Watanabe, o qual não o conheci e que esteve na caverna em questão com Ubirajara Macedo.
“Concha [Latim.conchula.]sf.1.Zool. Invólucro calcário ou córneo de muitos moluscos…” (“Mini Aurélio”, 8ª. edição, 2010, pág. 184).
A peçaacima referida, segundo aquele estudioso, seria do Paleozoico (unidade de tempo geológico composto por eras), com início entre 542/416 milhões de anos atrás. Seu início compreende o Siluriano, Ordoviano e Cambriano, seguindo-se outros três períodos: Devoniano, Carbonífero e Permiano. Ou seja, ele teve uma duração de aproximadamente 540 milhões de anos a 250 milhões de anos atrás.
O período Cambriano é que registrou o surgimento de animais com carapaça, sendo os trilobites (grupos extintos de artrópodes marinhos paleozoicos) os principais, com 70 por cento dos fósseis de então.
A Terra se mostrava com domínio de seres microscópicos no Paleozoico. E, num período relativamente curto para a história do planeta, de cerca de 40 milhões, a evolução deu um salto, conhecido por “explosão cambriana”, começando a surgir seres pluricelulares e, depois, seres macroscópicos, como as plantas e os animais que alteraram profundamente o meio ambiente então existente.
Dito escorrimento de calcário por certo só se registrou exatamente no princípio da formação de tal rocha sedimentar, entre 620 milhões a 680 milhões de anos atrás, o que se sabe por análises isotópicasem regiões variadas do Grupo Bambuí.
Shigueo Watanabe também é de opinião que a concha, que creditou ter sido de algum molusco marinho, um animal invertebrado que ali teria vividopor volta de 600 milhões de anos atrás, ainda carece de maiores estudos para sua datação precisa. Mesmo porque o que se tem como certo é que os primeiros moluscos surgiram há uns 550 milhões de anos.É sugerida mesmo a existência do filo desde o período Pré-Cambriano.
Com efeito, se essa concha tem idade de mais de 540 milhões de anos, tendo sido quase que totalmente revestida por um calcário ainda solúvel,a mesma remontaria ao tempo da formação do nosso calcário Bambuí. A hipótese levaria a concha para antes do início do Paleozoico.
Os primeiros invertebrados provavelmente habitavam a areia e o lodo do fundo do mar há uns 600 milhões ou um pouco mais. O ambiente era propício para se esconderem e encontrar bastante alimento, que afundava na água.Há cerca de 550 milhões de anos, surgiram os primeiros moluscos (mollis = “mole”).Mesmo assim, há apenas hipóteses sobre a origem dos moluscos, sem convergência de opiniões.
Os invertebrados, o segundo maior grupo de animais em número de espécies (aproximadamente 100.000 espécies, suplantados apenas pelos artrópodes), foram representados mais cedo no registro fóssil, em curto tempo, o que é problema à análise de sua sequência evolutiva.
A classe dos cefalópodes, ou Cephalopoda, também é chamada de gastrópodes. Possui umas 700 espécies ocupando reservatórios ou seu fundo. A classe é dividida em duas subclasses. Os primeiros são o extinto amonites e nautiluses, que representam chetyrekhabberny. A segunda categoria inclui choco, lula e polvo. Estes representam uma subclasse de coluna dupla. Frise-se que o corpo de moluscos distingue-se pela simetria bilateral. A concha está presente apenas em formas antigas, enquanto em outros representantes é rudimentar.Investigadores da Universidade de Bristol descobriram em Marrocos o fóssil de uma lesma com 480 milhões de anos, o que contribui para esclarecimentos pertinentes acerca da evolução dos moluscos, conforme trabalho recentemente publicado na revista Nature.
Os sambaquis da costa brasileira, que são conchas e moluscos ali depositados por populações anteriores ao período histórico, encontram-se, em sua maioria, na região meridional. Enquanto os moluscos serviam de alimento, rico em proteína, suas conchas eram e ainda são utilizadas como ornamento. São hoje coletadas e mesmo cultivadas, daí a existência de indústrias de pérolae de adornos de madrepérola em diversos países.
Conclusivamente a este respeito, a bióloga graduada Mariana Araguaia arremata:
“Representantes do filo Mollusca. Os moluscos são animais predominantemente marinhos e de vida livre, podendo, inclusive viver fixos ou enterrados. Embora exista grande diversidade de espécies, todos apresentam um mesmo plano estrutural e funcional. São conhecidas aproximadamente 50.000 espécies viventes, divididas em oito classes – entre as quais se destacam a classe dos gastrópodes, pelecípodes e cefalópodes – e 35.000 fósseis.”
“Gastrópodes são representados por caracóis, lapas, lesmas terrestres e marinhas, búzios, lotirinas, lebres-do-mar e borboletas-do-mar. É a classe mais diversificada do filo. Quando possuem concha, é uma peça única, podendo ser enrolada. São geralmente vagarosos, devido ao peso desta, principal forma de defesa. Para alimentação, todos utilizam rádula (órgão que permite ao animal raspar o alimento).”
“Pelecípodes, também conhecidos como bivalves,são representados pelos mexilhões (1), vieiras, ostras e teredos. Seus pés possuem forma de machado e há a presença de concha com duas valvas. A maioria são comedores de materiais filtrados e não possuem cabeça nem rádula.”
“Este filo abriga animais de corpo mole (molusca) e com simetria bilateral; triblásticos (três folhetos embrionários) e não segmentados; com corpo revestido por um epitélio simples, com cílios e glândulas mucosas. Além disso, são protostômios (no desenvolvimento embrionário, formam primeiro a boca e, depois, o ânus) e possuem celoma, um espaço preenchido por líquido no interior do organismo que, no caso dos moluscos, está localizado ao redor do coração e ao redor das gônadas e dos rins.”Giro outro, fósseis de animais pluricelulares destituídos de conchas, chamados de anêmonas do mar e provenientes das Montanhas Mackenzie, no Canadá, existiram no período Ediacarano, que muitos cientistas preferem incluir no Paleozoico, ao invés do Pré-Cambriano. Vem do Folhelho Burgess, exatamente no Canadá, um conjunto especial de fósseis, mas nenhum parecendo se encaixar numa classificação estabelecida; chama a atenção a Wiwaxia, lembrando uma lesma coberta com uma malha de ferro.
O Ediacarano registrou seres estranhos com corpo mole, na Austrália e na Inglaterra. Mas minerais formados nesse período de tempo apresentam falta de oxigênio, sugerindo uma condição climática glacial a provocar o desaparecimento de quase toda forma de vida.
A concha encontrada aderida ao teto da Caverna Glacialsuprarreferida, com efeito, carece de maiores estudos, mesmo porque o nissei antes referido sequer a classificou por seu nome científico. De mais a mais, pelo que andamos verificando em parca bibliografia, ela mais se parece às de mexilhões, e não de lesmas. Pelo menos foi a nossa impressão.
Importante salientar que mexilhões vieram e vivem em conchas. No livro “Fóssil” (Editora Globo, ano não informado), nas páginas 10/11, podemos ler:
“1. MEXILHÃO VIVO. O mexilhão prende-se às rochas e superfícies duras por meio de filamentos bissais. As partes moles são envolvidas por duas conchas calcárias. Cada indivíduo pode passar a vida toda no mesmo lugar. Se se desprender, pode morrer, especialmente se for colocado em ambiente diferente. 2. DETERIORAÇÃO. Ao morrer, as conchas abrem-se como “borboleta”. As partes moles logo começam a apodrecer ou são devoradas por animais predadores. 3. ORIJO PERMANECE. Quando as partes moles já deterioraram, a concha, que é a parte rija, permanece. 4. PARA FOSSILIZAR. Conchas vazias às vezes são carregadas pela correnteza e acabam se misturando a seixos e areia para formar praias pedregosas. Alguns dos espécimes tem seu par de conchas ainda unido por um forte tecido (ligamento); em outros, esse ligamento partiu-se. O movimento constante do mar quebra as conchas e os pedaços podem ser enterrados e fossilizar lentamente. 5. MEXILHÃOFÓSSIL. Aqui, uma argamassa mineral liga os grãos sedimentares às conchas fósseis, dificultando o trabalho do pesquisador para retirar as conchas.”
De outro ângulo, ante a total ausência de diamictitos na Caverna Glacial e em suas proximidades, não se pode falar no peso de uma geleira em seu auge para a formação na sua base dessa rocha conglomerática. O “cimento natural” da Caverna Glacial lhe dá inteira sustentação. Ela aparenta ser muito frágil porque formada da agregação de materiais esparsos “cimentados” pela própria natureza, inexistindo uma rocha sólida inteiriça, como o calcário, para lhe dar sustentação, mormente quanto a seu teto, que parece prenunciar um desabamento num futuro próximo.
Estivemos em cima desse teto, portanto a céu aberto, e o cenário era de pastos, árvores miúdas e duas ou três reses. A região de Coração de Jesus está inserida no domínio das savanas-cerrados/campos gerais tropicais, conforme sua classificação fitogeográfica. Passando por baixo de uma cerca, descobrimos na outra manga após a estrada a saída da claraboia da caverna calcária.
A concha,encontrada no teto da Caverna Glacial e recolhida posteriormente para o museu de Coração de Jesus, se mesmo marinha, vem referendar, por outro lado, a origem de determinadas marcas de onda deixadas no sítio das geleiras, em Jequitaí, conhecidas nos meios acadêmicos como ripplemarks: em sedimentologia, ondulações em forma de onda ou marcas de ondulações em forma de onda em sedimentos – arenito, calcário, siltitos e dunas, indicando agitação pela água ou vento.
Enfim, trata-se de uma caverna com rebotalhos de toda ordem, alguns por certo arrastados de lugares distantes, o que é típico de uma “terra arrasada” como causa ou efeito do recuo de uma geleira.
Demonstração de que a Caverna Glacial antecede a formação propriamente dita dos enormes maciços calcários anotados em Coração de Jesus é que, a poucos metros dela, existe a caverna inteiramente calcária denominada Maria Cobra, que percorremos por diversos metros, no final dos anos 70, e desistimos após determinada distância ante sinais da existência em suas galerias extremamente úmidas do letal monóxido de carbono. Pela exiguidade de tempo, não pudemos percorrer as imediações daquela abertura subterrânea, para que dúvidas não restassem, em busca de uma possível nova ocorrência de diamictito. Anos atrás, encontramos uma pedreira dessa natureza bem próxima do distrito de Água Boa (município de Claro dos Poções). Em linha reta, a distância entre ela e a Caverna Glacial é de aproximadamente 10 quilômetros ou pouco mais.
Um conglomerado polimítico propriamente dito, correspondendo a um paleocanal das coberturas terciárias, foi identificado no município norte-mineiro de São João das Missões, mostrando clastos de arenito quartzoso, calcário micrítico, calcário esparítico, gnaisse e grãos de quartzo, feldspato e mica.
A classificação de conglomerados de tal ordem, os quais levam em conta sua granulação, composição e tipo de cimento natural unindo os clastos, diz respeito ao ambiente originário: conglomerados marinhos, fluviais ou glaciais. Encontramos uma dessas estruturas sedimentares decorrentes de um mar interior em Jequitaí, ora no nosso acervo, bem como percebemos as mesmas marcas de ondulações em um gigantesco bloco abatido abaixo da cachoeira do resort de Santa Bárbara, no município de Joaquim Felício, situado entre o norte e região central de Minas Gerais.
A Serra do Cipó, por exemplo, perto de Belo Horizonte, tem sua pré-história remontando há mais de um bilhão de anos. Os quartzitos, rochas arenosas predominantes naquela região, se formaram pela deposição marinha em tempos geológicos que o homem sequer conheceu. Os ripplemarks,isto é, marcas formadas pelas ondulações da areia ao sabor das ondas, ali são comuns. Hoje, na rocha já consolidada, suas marcas permanecem como testemunhas inapagáveis de um oceano pré-histórico.
Milhões de anos depois do afastamento de suas águas e soerguimento das montanhas que formam a atual Serra Geral, ou Serra de Minas (também chamadade Serra do Espinhaço), a alteração das rochas deu origem aos solos onde hoje o cerrado, a Mata Atlântica e os campos rupestres constituem algumas das riquezas daquela serra.
Devo frisar aqui, a propósito da Serra Geral, considerada reserva mundial da biosfera, que elatambém é conhecida porSerra do Espinhaço, nome que lhe foi dado pelo barão alemão Ludwig Wilhelm vonEschwege, no século XIX, ao fundamento de ser responsável pela divisão das redes de drenagem do Rio São Francisco e as dos rios que correm diretamente para o Oceano Atlântico.
Mas há quem ache errada a denominação de “Espinhaço”, uma vez que a sua orografia central, lembrando sua espinha dorsal a de um quadrúpede, não seria divisor de água de duas vertentes contrapostas.Em Itacambira, por exemplo, ela se encontra inteiramente na Bacia do Jequitinhonha em extensão considerável. Por conseguinte não existiriam duas bacias hidrográficas que separa,daí a alegada impropriedade do seu nome.
A Serra Geral (seu nome usual hoje), aurífera e diamantífera em trechos que se multiplicam por sua extensão, na verdade, é um conjunto de serras de certa forma individualizadas formando a cordilheira brasileira, com pouca variação longitudinal. Corta nosso território no sentido Norte-Sul, desde o Quadrilátero Ferrífero no centro de Minas Gerais até a Chapada Diamantina, na Bahia, em mais de 1.000 quilômetros de extensão.
Divide, na verdade, o território mineiro nas terras a leste (Mata Atlântica) e nas terras a oeste, cobertas pelo cerrado. Há uma lacuna ao norte, seguindo-se a elevação da Chapada Diamantina, em meio à caatinga.
O município de Salinas, no setentrião mineiro seguindo para o Estado da Bahia, também guarda registro de um mar interior, que recuou deixando em suas terras o sal-gema, daí o nome do município. Sua acumulação se deu pela evaporação da água dos mares em época pretérita da história física da Terra.
Na zona rural do município norte-mineiro de Francisco Sá, percebemos também, junto a um sítio paleontológico de animais extintos da fauna pleistocênica, no leito seco de um córrego temporário, esse sal de terra, denominação dada pelos caboclos para as eflorescências salinas, onde o gado fica por ali lambendo-o.
Fui entrevistado pela TV Globo sobre tal ocorrência e também sobre o sítio arqueológico ao lado, de animais extintos da nossa fauna pleistocênica, no antigo Brejo das Almas, matéria veiculada em seu “Jornal Nacional” e no “Fantástico”. Na Alemanha são realizados os principais estudos teóricos e práticos sobre o sal-gema, na jazida de Stassfurt.
Quem possuía em sua casa uma mão-de-pilão elaborada emdiamictito, com um minúsculo diamante nela incrustado, também proveniente de Jequitaí, era o historiador montes-clarense Simeão Ribeiro Pires. Mão-de-pilão foi um instrumento lítico utilitário produzido pelo nosso homem primitivo. Também percebemos possíveis inclusões de diamante em diamictitos dinamitados – também para utilização nas obras de construção da BR-365–muito próximos do trevo de acesso à cidade de Jequitaí.
Há registro de marcas de onda (ripples) em siltitos nas proximidades de Miravânia (município vizinho de Montalvânia, Cônego Marinho, São João das Missões e Manga). Por fim, pesquisadores descobriram microfósseis de origem marinha na atual região do Alto Paranaíba, cujos dados só conseguimos encontrar no jornal belo-horizontino “Hoje em Dia”, de 08/09/1996, na página 15, de “Ciência & Tecnologia”, como se segue:
“Na era dos dinossauros, o mar invade o Brasil e chega a Minas Gerais. Deixa ali alguns animais microscópicos, de apenas uma célula. Passados 100 milhões de anos, eles reaparecem como fósseis. Parece roteiro de filme de ficção, mas não é. O estudo de um pesquisador brasileiro e de um norte-americano concluiu que a atual região do Alto Paranaíba foi coberta por águas marinhas durante um breve período do final da “era dos dinossauros”, o Cretáceo.”
“O carro-chefe da constatação de uma invasão marinha foi a descoberta de radiolários, que são animais exclusivamente marinhos”, diz Dimas Dias-Brito, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro (SP). Segundo ele, a invasão do mar nessa região teria durado pouco tempo. A rocha onde foram encontrados os radiolários, animais do mesmo grupo das amebas, é “fina”. “Ainda não há nenhuma evidência de um ‘pacote marinho’ espesso abaixo e acima desse silexito (rocha). A ideia é que o mar teria se retirado rapidamente.” “Há cerca de 140 milhões de anos, no início do Cretáceo, a África e a América do Sul estavam coladas. Mas, entre 130 milhões e 110 milhões de anos, começou a se abrir uma fenda entre os continentes. Com o alargamento dessa fenda, surgiu o Oceano Atlântico, há cerca de 115 milhões de anos. Entre esses dois momentos o mar invadiu o Brasil. A ideia de que a região teria sido coberta pelo mar surgiu em 1991, quando a pesquisadora SeniraKattah encontrou evidências de que algumas rochas da região da cidade de Patos de Minas (Alto Paranaíba) teriam radiolários.”
“Em 1995, Dias-Brito e Emile Pessagno, da Universidade do Texas, voltaram à região e confirmaram a descoberta de Kattah e classificaram os microfósseis. Eles estavam “presos” no silexito, um tipo de rocha conhecida popularmente como ‘pedra-fogo’.”
“Ao estudar os fósseis, os cientistas depararam com um grande problema: de onde teriam vindo as águas que cobriram Minas? Uma das hipóteses propostas por eles é a de que teria sido o Oceano Pacífico o “invasor”. Isto porque um dos radiolários existentes no silexito pertence a um gênero comum há cerca de 130 milhões de anos. Nessa época, o Atlântico Sul ainda não havia completado sua formação. A água deve ter vindo do Sul. Também há 130 milhões de anos, radiolários como os de Minas estavam presentes em latitudes iguais ou maiores do que 22 graus. Portanto, os pesquisadores acreditam que a invasão tenha acontecido a partir de águas mais austrais.”
“A outra hipótese é a de que o próprio Atlântico teria invadido o continente. A ideia é baseada na datação de pólens encontrados em camadas inferiores ao silexito mineiro, cuja idade é de 115 milhões de anos, época em que o Atlântico já havia se formado.”
“Para Antônio Carlos Rocha Campos, paleontólogo do Instituto de Geociências da USP, “essa pode ser a primeira evidência de que a formação geológica Areado (onde foi encontrado o silexito) é de origem marinha”. “Segundo se acreditava, as informações do Cretáceo eram inteiramente continentais”, disse. Mas, segundo o pesquisador, é preciso que se aprofunde o estudo para que se descubra de onde veio a invasão. “É preciso achar a trilha que o mar teria deixado”.”
“Além dos cardiolários, os pesquisadores também encontraram espículas de esponjas presas no silexito, rocha formada por sílex. As espículas, cuja forma lembra a de agulhas, são uma espécie de “esqueleto” de sustentação dos animais. “Essa associação é classicamente encontrada em sedimentos do Jurássico e do Cretáceo em todo o mundo”, disse Dias-Brito. Para Rocha Campos, a presença dos radiolários já é suficiente para dizer que houve mesmo uma invasão, já que eles são marinhos.”
Lado outro, a deposição do Grupo Bambuí foi iniciada em ambiente marinho raso, redundando no término das rochas da Formação Jequitaí. Isto possibilitou o soerguimento da plataforma carbonática da Formação Sete Lagoas, quando foram depositados os calcários. Daí notamos que, em meio ao diamictito da Formação Jequitaí, o calcário não abunda nem tem tamanho destacado.
E, não nos alongando mais, uma regressão marinha na Formação Lagoa do Jacaré permitiu a deposiçãode lentes de calcário na região norte-mineira de Lontra.
“O gelo é o mais formidável exemplo de agente natural capaz de “raspar” totalmente uma área. Na superfície terrestre, nenhum outro agente é capaz de realizar movimentos mecânicos tão vigorosos sobre as rochas… Se existem solos ou materiais menos resistentes nas encostas das montanhas, o gelo os remove e, às vezes, origina exposições de grandes massas de rocha, com estrias e sulcos paralelos ao sentido de movimentação. As rochas por onde passam as massas de gelo são submetidas à intensa raspagem. Com o resfriamento, o gelo tende a “grudar” na superfície da rocha. Com o tempo, pedaços desta vão sendo arrancados. Surgem então formas arredondadas, lembrando carneiros deitados (rochas moutonnés), ou semelhantes ao dorso de baleias (drumlins)”, conforme trabalho de Fernando Flávio Marques de Almeida e Celso Dal Ré Carneiro, “Geleiras no Brasil – Os Parques Glaciais de Salto e Itu (SP)”, publicado na revista “CiênciaHoje”, volume 19, número 112, página 26).
Por outro lado, a geologia nos mostra que se há alguma parte da superfície da Terra coberta por gelo, nós já estamos vivendo em uma era glacial. Temos hoje aproximadamente dez por cento da Terra sob geleiras e glaciares (no ápice de uma glaciação, tal proporção fica em trinta por cento). Evidencia-se que,na maior parte de sua existência, o planeta teve uma temperatura média de oito a 15 graus Celsius acima da atual, o que impediu que qualquer área da Terra permanecesse congelada.
Entretanto, em seu último bilhão de anos, nosso planeta enfrentou cinco períodos glaciais. O atual é o sexto, com seu início há aproximadamente dois milhões de anos. No decorrer de certo período glacial, a temperatura nem sempre é a mesma. Para cada 100 mil anos de muito frio, passamos por cerca de 10 mil anos com temperatura mais amena. A Terra encontra-se há oito mil anos em um desses períodos de menor expansão de sua camada de gelo. Contudo, a previsão é que daqui a dois mil a quatro mil anos terá início outro aumento da nossa cobertura de gelo.
Há previsão de chegada próxima ao Brasil de nevasca, que atingiu Santiago em 1971, trazendo intenso frio para as regiões do Sul, Sudeste, Centro-Oeste e sul da região Norte, como indica o Instituto Nacional de Meteorologia do Brasil (INMET).
Não bastando, meteorologistas do NationalOceanicandAtmosphericAdminstration (NOAA), órgão ligado à NASA, responsável por monitoramento de condições atmosféricas oceânicas ao redor do globo, chegaram a projetar a possibilidade de precipitação de neve para o Sul do Brasil em 2017 (ocorrências repetidas em 2018 e 2019).
A ciência ainda não precisou o que provoca uma era glacial. Existem teorias buscando explicar esta variação entre fases mais frias e mais quentes no decorrer de uma glaciação. A principal delas tem como base as diversas mudanças registradas nas órbitas terrestres. Primeiro, o eixo de rotação da Terra não forma um ângulo perfeito de 90 graus com a linha do Equador: o planeta está ligeiramente inclinado. O ângulo dessa inclinação sofre alterações devido à influência da força gravitacional dos demais planetas. Essa é uma das mudanças. Segundo, o eixo de rotação também gira em torno de si mesmo como se fosse um pião, por influência da atração do Sol e da Lua. Em terceiro lugar, o movimento em torno do Sol não é sempre igual, também devido à força de gravidade dos planetas. O somatório destas mudanças faz com que exista variação na quantidade de energia que chega do Sol, o que provoca o esfriamento. Mostradas ditas teorias entrelaçadas com as órbitas terrestres, em contrapartida é afirmado que uma glaciação é um fenômeno intitulado “Paradoxo da Hibernação Solar”.
Como exemplo tivemos o esfriamento do clima global que provocou a Pequena Era do Gelo (1400 – 1650). Esta, trazendo penúria e desnutrição à população, foi prenunciada pela horrorosa peste negra, pandemia mais mortal da história e que entre 1347 e 1352 eliminou entre 30 e 50 por cento da população europeia.
Na hibernação solar, a atividade da nossa estrela é tão precária que não há ejeção de matéria da sua coronal em direção ao espaço. Ou seja, as tempestades solares desaparecem ou são praticamente nulas, o que leva aquele astro a um estado de calmaria.
Cientistas que acompanham o fenômeno anotaram que a atividade solar máxima vem enfraquecendo presentemente, com o que o período de mínimo solar se estende. Artigo na publicação científica “AnnalesGeophysicae” assegura que se ocorrer uma menor atividade do Sol e uma fase de mínimo solar ampliada, ocorrerá uma nova glaciação. A Terra gelará: o que hoje é subtropical se tornará clima temperado e quanto mais próximo aos polos, maior o avanço do frio.
“O Paradoxo da Hibernação Solar é o caminho contrário ao aquecimento global. O Sol, que é a principal fonte de energia em forma de calor, agora estaria colaborando para o esfriamento. A estrutura magnetizada tanto do planeta como da estrela vive numa disputa equilibrada. Quando há mais atividade solar, menor é a penetração de raios cósmicos na atmosfera terrestre. As partículas solares impedem esse ingresso da radiação espacial, que chegam até a10 quilômetros na troposfera e ionizam essa parte da atmosfera terrestre”(“AnnalesGeophysicae”). Resta claro que a redução da atividade solar não depende do aquecimento global causado pela atividade humana – esta ocasionando efeito estufa, desmatamento e emissão de gases, o que não quer dizer que não tenhamos de relegar ao esquecimento nossas responsabilidades ambientais, esperando um resfriamento global por conta do Sol.
No Encontro Nacional de Astronomia, pesquisadores aventaram sobre uma possível era do gelo em 2030. O estudo, anunciado pela professora Valentina Zharkova, da Universidade de Nortúmbria, se baseou em modelos computadorizados de manchas solares, os quais mostraram 97 por cento de acertos no mapeamento de movimentos anteriores da atividade solar.
Estando certas essas previsões, por volta de 2022, uma parte de ondas deverá se mover até os hemisférios norte e sul do Sol, o que reduziria ditas atividades. Eventualmente as duas ondas estariam em sincronia, entrando em seu pico ao mesmo tempo, porém em hemisférios opostos. Isso provocaria o que é denominado por climatologistas de mínimo de Maunder – período de 70 anos, entre 1645 e 1715, quando o Sol produziu poucas manchas solares, provocando outra pequena era do gelo em partes da Europa e continente norte-americano. O rio Tâmisa, em Londres, permaneceu congelado durante sete semanas. Essas condições são esperadas para os próximos anos, até a era do gelo propriamente dita. A seu turno, uma dupla de cientistas russos, RaulfGaliulin e Vladimir Bashkin, fez previsão de queda gradual na temperatura da Terra a partir de 2014, bastante lenta num primeiro momento, devendo culminar em uma nova era do gelo dentro de um período de 50 anos.
A variação da temperatura da Terra encontra-se, indubitavelmente, associada aos ciclos das atividades solares, já em processo de redução e devendo esta diminuição da temperatura afetar todo o mundo.
Aquecimento global decorrente da atividade humana, que provoca elevação de temperatura, não deve ser confundido com atividade solar, a qual se sobrepõe à sina predatória ambiental do homem. Já existem sinais de frio intenso na Terra, fazendo nevar, por exemplo, em 2018 (pela terceira vez em 40 anos) em pleno deserto do Saara. Pode-se afirmar que o homem moderno construiu sua civilização numa época de calmaria solar, ou seja, num período interglacial iniciado por volta de 11 mil anos atrás, coincidindo com o término da última era do gelo. Mas a cada 11/16 mil anos alternam-se períodos de grande intensidade solar, com as suas manchas bastante desenvolvidas, com períodos de baixa atividade. Portanto estamos entrando no período de baixa atividade, uma vez decorrido o lapso temporal de 11/16 mil anos. Contudo, há pouco tempo, a NASA mostrou imagens nas quais se observava a ausência de manchas solares. Se para um leigo isto pode não significar nada, a seu turno cientistas mostram-se alarmados. A conclusão mais provável é que o Sol esteja entrando em outra fase fria, um novo Solar Minimum, trazendo consigo uma nova era glacial, ou então uma mini-era glacial, a ser iniciada em 2019/2020.
Astrônomos especialistas daquela agência espacial afirmam que a atividade das manchas solares funciona como um pêndulo, balançando de trás para a frente ao longo das eras geológicas. O contrário de um prenúncio da proximidade de nova era glacial seria que a superfície volátil de nossa estrela estivesse coberta de manchas solares.
Mas, refrise-se, não é o que está acontecendo, pois a ausência de manchas solares significa um período de baixíssima intensidade magnética do Sol, processo que deverá continuar pelos próximos anos até mudar drasticamente o clima terrestre. Calcula-se que o novo congelamento perdurará durante um mínimo de três ciclos solares (30 anos). E a nossa espécie não estaria preparada para outra era do gelo, mínima ou de maior amplitude.
Por fim, durante os últimos milhões de anos tivemos diversas eras glaciais com frequências de 40.000 a 100.000 anos. Destacam-se a Glaciação Donau,há cerca de 2 milhões de anos; a Glaciação Günz,há cerca de 700 mil anos; a Glaciação Mindel, hácerca de 500 mil anos; a Glaciação Riss, há cerca de 300 mil anos; e a Glaciação Würm, há cerca de 150 mil anos.
Reiterando a existência de determinadas circunstâncias a indicar que estamos próximos de uma nova era do gelo, porque a Terra atravessa aproximadamente 10.000 anos de temperatura quente a cada 90.000 anos de uma glaciação, por outro lado, mercê da ação do homem com suas agressões ambientais, o planeta atravessa, em tempos recentes, um contínuo período de aquecimento global sobremodo acelerado, ao invés de estar iniciando sua fase de esfriamento a anteceder a próxima era do gelo.
Se de um lado temos pesquisadores e/ou cientistas que acreditam que esseefeito estufa adiaria uma nova glaciação e seus efeitos danosos por longo período de tempo ainda, de outro lado o aumento da temperatura planetária traz consigo a enormidade de desastres ecológicos que estamos assistindo, como incêndios na floresta amazônica, furacões e tornados, secas e queda na diversidade biológica. Como quer que seja, o aquecimento provocado pelo homem não significa aumento de temperatura em toda a Terra, mas da temperatura global média. Em outras palavras, o período de baixíssima intensidade magnética do Sol independe do efeito estufa, desmatamento e emissão de gases. Numa visão mais otimista, esta conjuntura faz com que o derretimento das calotas polares altere as condições presentes das correntes marítimas, provocando longos períodos de forte glaciação no hemisfério norte (América do Norte e Europa,em especial), ao passo que o hemisfério sul sofreria um forte aquecimento.
Como exemplo desta visão otimista, podemos frisar que o eixo da Terra encontra-se hoje numa posição similar e de outras eras glaciais, e mesmo assim o Ártico, recebendo o mínimo de energia solar, não estaria dando indícios de uma glaciação próxima, que assim seria adiada para os próximos 100 mil anos. Não pairam dúvidas acerca da gravidade do atual aquecimento global. Os seis anos mais quentes do atual Holocento (que pessoas dos meios científicos buscam denominar de Antropoceno, mas sem consenso) foram registrados entre 2014 e 2019. Se o aquecimento global hoje enfrentado teria o condão de adiar o próximo glacial para começar daqui a 100 mil anos, há outra corrente de pesquisadores acreditando que o homem sucumbiria antes, pelas já assustadoras consequências do progressivo aquecimento global. Isto significaria a antecipação do apocalipse.
Como quer que seja,vindo o nosso planeta a registrar temperaturas elevadíssimas, em total detrimento da vida, após tal fenômeno, sobre terras então esturricadas, se precipitaria a esperada próxima glaciação. Se já finda a calmaria presente do Sol, a esperada era do gelo aconteceria em estágio semelhante futuro, e sem mais contar com a presença da espécie Homo no planeta.
O artigo que se segue, de José Eustáquio Diniz Alves, originariamente publicado em “EcoDebate”, trata com precisão das consequências desairosas do aumento do aquecimento global, como se segue.
“Os 6 anos mais quentes do Antropocentro: 2014-2019.
“Na ausência de um ajuste significativo da maneira como bilhões de seres humanos vivem, partes da Terra provavelmente se tornarão próximas a inabitáveis e outras partes terrivelmente inóspitas, antes do final deste século” David Wallace-Wells (09/07/2017).
O mundo tem apresentado temperaturas cada vez mais altas ao longo do tempo, sendo que a atual década tem batido todos os recordes das décadas anteriores. O aquecimento global é uma realidade inquestionável. Os 6 anos mais quentes do Antropoceno aconteceram entre 2014 e 2019.
O ano mais quente do século XX foi 1998, que apresentou uma temperatura 0,63º Celsius acima da média do século. Porém, nos anos seguintes houve redução da anomalia e somente em 2005 a temperatura bateu novo recorde, de 0,66º C acima da média do século XX. Novo recorde aconteceu somente em 2010 com 0,70º C. Em 2011 houve desaceleração do aquecimento global e a temperatura média de 0,58º C (acima da média do século XX) ficou abaixo daquela apresentada em 1998. As temperaturas de 2012 e 213 ficaram abaixo dos valores de 2010.
Todavia, o quadro mudou radicalmente a partir de 2014, pois além de bater novo recorde com 0,74º C, a temperatura média do referido ano passou a se constituir em um novo piso para a série histórica que começou em 1880. Em consequência, os 6 anos compreendidos entre 2014 e 2019 são os mais quentes já registrados. O gráfico abaixo mostra as variações diárias e mensais dos últimos 6 anos e aponta para a possibilidade de 2019 ser o segundo ano mais quente da série.
De fato, os meses de junho e julho foram os mais quentes já registrados, com variação de 0,95º C, em relação à média do século XX, como mostra o gráfico abaixo. A Europa teve duas ondas recordes de calor em 2019, uma em junho e outra em julho. Diversas cidades tiveram temperaturas elevadas e nunca antes registradas. Portugal e outros países sofreram com os incêndios florestais. Nestes dois meses, vastas extensões de latitudes do norte da Terra ficaram em chamas. O clima quente tomou conta de uma enorme porção do Ártico, do Alasca à Groenlândia e à Sibéria. Isso ajudou a criar condições propícias para incêndios florestais. Alguns deles foram realmente enormes e queimaram de maneira singular e sem precedentes. Artigo de Crunden (15/07/2019) mostra que as mudanças climáticas estão agravando os incêndios florestais.
O gráfico abaixo, com dados da NOAA, mostra que, no período janeiro a julho, a temperatura mais alta aconteceu em 2016, com 1,1º C acima da média do século XX. As outras duas marcas mais altas aconteceram em 2017 e 2019, ambas com uma anomalia de 0,95º C acima da média do século XX, para os primeiros sete meses do ano. A linha de tendência mostra que a temperatura está subindo 0,21º C por década no século XXI (quando estava subindo 0,08º C por década entre 1880 e 2019). Isto quer dizer que o aquecimento global está se acelerando e, no mínimo, vai subir 2º C no atual século, mantida a tendência das duas últimas décadas. Mas o mais provável é um aquecimento cada vez mais intenso, como alerta o IPCC.
Mas apesar de todos os alertas, o mundo continua consumindo combustíveis fósseis, liberando metano na agropecuária e agravando o efeito estufa. Continua também desmatando e destruindo os ecossistemas. Assim, cresce a concentração de gases de efeito estufa e aumenta o nível de CO2 na atmosfera, que, em 2018, foi de 408,52 partes por milhão (ppm), e está aumentando em 2,4 ppm ao ano na atual década (mas pode passar de 3 ppm em 2019). Sendo que o nível seguro é 350 ppm.
Artigo de Matt McGrath, na BBC (24/07/2019) mostra que o alerta do IPCC sobre o prazo de “12 anos para salvar o planeta” se transformou em 18 meses. A necessidade de reduzir as emissões em 45% até 2030 para manter as temperaturas globais abaixo de 1,5º C neste século se antecipou e agora o prazo é o final de 2020. A sensação de que o final do próximo ano é a última chance de mudança climática está se tornando mais clara o tempo todo. Com base em evidências científicas, ele escreve: “Acredito firmemente que os próximos 18 meses decidirão nossa capacidade de manter a mudança climática em níveis de sobrevivência e restaurar a natureza ao equilíbrio que precisamos para nossa sobrevivência“.
A velocidade do aquecimento global nunca foi tão rápida quanto é hoje e está afetando o planeta inteiro simultaneamente, pela primeira vez em, pelo menos, dois milênios. Uma pesquisa, publicada na revista NatureGeoscience (24/07/2019) reconstruiu a temperatura média da Terra nos últimos dois milênios, destacando a surpreendente taxa de aquecimento generalizado do nosso planeta no século passado e, em especial, nas últimas décadas.
Desta forma, se este quadro não começar a ser revertido urgentemente, o colapso ambiental pode se tornar inevitável. O aquecimento vai provocar o degelo do Ártico, da Antártida e da Groenlândia, elevando o nível dos oceanos, o que ameaça bilhões de pessoas que moram nas áreas costeiras. O aquecimento também deve provocar o degelo dos glaciares do Himalaia e o leste e o sul da Ásia, lar de bilhões de pessoas, vão sofrer com a falta de água. O aquecimento global é um dos elos fracos do Sistema Terra e pode provocar um grande desastre ecológico. No longo prazo, pode ser o apocalipse para todos os seres vivos do Planeta, incluindo a espécie que é culpada e vítima deste processo: a humanidade.
Como disse o cientista David Suzuki: “Se quisermos que a Terra permaneça habitável para os seres humanos e para outras formas de vida que nos tornam possíveis, devemos fazer escolhas difíceis, promover soluções e nos envolver mais politicamente” (04/08/2019). A Greve Global pelo Clima de 20 a 27 de setembro de 2019 é uma boa oportunidade para as pessoas se manifestarem.
Sem dúvida, cientistas de todo o mundo alertam para a situação de emergência climática. E como diz, acertadamente, a garota a ativista sueca Greta Thunberg: “Eu não quero que vocês estejam esperançosos. Eu quero que vocês estejam em pânico. Quero que vocês ajam como se a casa estivesse pegando fogo. Porque está!”.
Pelo sim, pelo não, a retração do calor solar não deixará de ser danosa, mais cedo ou mais tarde, paratoda a Terra, e mesmo os defensores do aquecimento global também têm certeza que a baixa na atividade solar ainda afetará o clima planetário, mas contando numa prorrogação da próxima era do gelo, como posto antes.
Trata-se, enfim, de um terreno ainda completamente desconhecido por nossa espécie, não passando de especulações a previsão de que a próxima era glacial estaria sendo adiada. Tanto é verdade, como já salientado antes, que contamos com cerca de 50 teorias a tentar explicar a ocorrência cíclica das glaciações terrestres.
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(1)Mexilhão é nome comum, sem valor taxonômico, que identifica diversas espécies de moluscos bivalves. Ditas espécies, de grupos filogenéticos distintos, se caracterizam por apresentar conchas alongadas e assimétricas, as quais ficam presas ao substrato por um feixe filamentoso (o bisso).
(2). A matéria menciona o período atual como Antropoceno, o qual não passa ainda de uma tentativa, sem consenso nos meios científicos, de se estabelecer uma nova era na escala geológica marcada pelas ações da nossa espécie, ou como um sinal de alerta para as intervenções humanas sobre os mais variados sistemas da Terra. Ou seja, esta nomenclatura não persiste, porque estamos no Holoceno, nome dado aos últimos 11 mil anos da história da Terra, portanto pós-glacial, marcado por temperaturas de mornas para quentes. O Holoceno, assim, é a época atual do presente período Quaternário.
(3). Entre os incêndios florestais de 2019 no planeta, precisamos incluir, talvez como o de proporção mais alarmante e grave, o mesmo fato registrados na Amazônia sul-americana, com seu auge em agosto deste mesmo ano.
(Agosto de 2018/agosto de 2019).
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