Conflito é capítulo da guerra desde 1948, diz embaixador palestino
Ibrahim Alzeben pediu o fim imediato dos bombardeios à Faixa de Gaza Por Lucas Pordeus León - Repórter da Agência Brasil - Brasília
O embaixador da Palestina no Brasil, Ibrahim Alzeben, falou com exclusividade à Agência Brasil nesta quarta-feira (11) sobre o conflito iniciado no último sábado (7). Da Cisjordânia, o diplomata palestino afirmou que o atual episódio é apenas mais um capítulo da guerra que Israel começou contra a Palestina em 1948.
Ele ainda pediu o fim imediato dos bombardeios à Faixa de Gaza e responsabilizou as potências ocidentais por permitirem que Israel desrespeitasse os limites territoriais da Palestina definidos pelas Nações Unidas.
“O que esta acontecendo agora é a continuidade – um capítulo mais – da guerra que fez Israel contra o povo palestino. É a continuidade da guerra que começou em Israel desde sua criação, até o momento, negando o direito do povo palestino à existência”, destacou. Ibrahim Alzeben qualificou o conflito como chacina e apelou para que as potências Ocidentais detenham os bombardeiros de Israel. Sobre a posição do governo brasileiro, o diplomata destacou que, apesar de respeitar o posicionamento do Brasil, não concorda com os termos dos comunicados oficiais.
Para Alzeben, o Brasil tem importante papel a desempenhar como mediador do conflito. “Brasil é amigo de ambas as partes, tem o respeito de ambas as partes e tem respeito à nível internacional e pode fazê-lo. Agora, se tem sucesso ou não, isso depende das circunstâncias internacionais”, respondeu.
Questionado sobre o fato do Hamas não aceitar o Estado de Israel, o representante da Autoridade Palestina, que controla a Cisjordânia, disse que o grupo de Gaza é consequência das violações dos direitos dos palestinos. “Não existia o Hamas (até 1987). Quem é responsável por isso são os sucessivos governos de Israel que levaram a criação de várias organizações, inclusive, e de criar essas situações beligerantes”, concluiu.
Confira a seguir a entrevista completa com o embaixador da Palestina no Brasil Ibrahim Alzeben, que falou sobre o que deveria ser feito para suspender as hostilidades iniciadas no último final de semana.
Agência Brasil: Embaixador, como que a Autoridade Palestina analisa a ação do grupo Hamas no último sábado? Como vocês avaliam essa ação?
Ibrahim Alzeben: O senhor perguntou ao embaixador de Israel como ele avalia a chacina que está cometendo?
Agência Brasil: Perguntei a ele o que Israel tem feito para reduzir as baixas civis e como responde às críticas de que Israel pratica um Apartheid contra o povo palestino.
Alzeben: Seria bom perguntar a ele porque o que está acontecendo agora é a continuidade – um capítulo mais – da guerra que fez Israel contra o povo palestino. Não adianta te dar qualificativos. É a continuidade da guerra que começou em Israel desde sua criação, até o momento, negando o direito do povo palestino à existência. Além da terra arrasada que estão praticando, eles seguem desumanizando os palestinos. Não sei se o embaixador de Israel nos considera desumanos, que não somos humanos. Realmente, não adianta, a essa altura, começar a fazer qualificações e cair nessa armadilha de fugir da realidade que esse é um capítulo mais – lamentável, triste e destrutivo – daquela guerra que começou em 1948.
Agora, ficar procurando qualificativos? Eu acho que a essa altura não tem muita importância. O que importa, como jornalismo, como diplomata, como superpotência, como Nações Unidas, como comunidade internacional, é como parar essa loucura. O que está acontecendo é uma chacina e que tem que parar. Se continuar vão ser mais vítimas, mais sofrimento e vamos ficar mais distantes de uma solução. Erramos ou não, somos vizinhos e, como vizinhos, temos que nos respeitar, do mesmo jeito que os vizinhos na América Latina se respeitam. Pode ser que não compartilhem algumas coisas, mas se respeitam. As fronteiras são respeitadas, as relações diplomáticas, e há cooperação. Isso é o que devemos procurar a essa altura. Não adianta procurar qualificativos e adjetivos.
Agência Brasil: Como a Autoridade Palestina analisa a posição e as medidas do governo do Brasil, até o momento, em relação ao conflito?
Alzeben: O Brasil é um país amigo, o senhor presidente é um amigo que goza de todo nosso respeito e carinho. Não somente do povo palestino, ele é um líder mundial que tem todo nosso respeito. Se o senhor quer se referir ao comunicado, nós respeitamos, simplesmente respeitamos a soberania de todos os países amigos, podemos compartilhar ou não, e não compartilhamos a última declaração não.
Agência Brasil: Como que o Brasil poderia ajudar a mediar esse conflito levando em conta que o país preside atualmente o Conselho de Segurança da ONU?
Alzeben: Estou seguro de que se estivesse nas mãos do governo do Brasil faz tempo que eles teriam feito. Brasil é amigo de ambas as partes, tem o respeito de ambas as partes e tem respeito à nível internacional e pode fazê-lo.
Agora, se tem sucesso ou não, isso depende das circunstâncias internacionais. O Brasil é país amigo e se estivesse em suas mãos colocaria fim a esse conflito faz tempo.
Agência Brasil: O que poderia ser feito neste momento para cessar as hostilidades, para que a guerra pare? O que poderia ser feito e quem poderia fazê-lo?
Alzeben: Deve ser um esforço coletivo e não somente deixar nas mãos dos Estados Unidos que demonstrou ser um aliado incondicional da agressividade de Israel, mandando porta-aviões e munições e mais armas de destruição. Deve ser um esforço coletivo da comunidade internacional, obviamente com uma presença notória do Brasil. Os Estados Unidos participariam como parte e não como único mediador. Tem que parar essa chacina, tem que parar esse fogo cruzado, esse bombardeiro contínuo e indiscriminado na Faixa de Gaza.
Agência Brasil: A maior parte da comunidade internacional, incluindo o Brasil, defende que a saída para as hostilidades seria a consolidação de um Estado palestino economicamente viável. Por que essa saída ainda não foi possível após 75 anos da criação do Estado de Israel?
Alzeben: Como falei, esse episódio é a continuidade de uma guerra que Israel empreendeu contra nós. Israel está impedindo a criação do Estado Palestino com apoio lamentável dos Estados Unidos, que é uma superpotência que, no lugar de cuidar do direito internacional e da paz mundial, está ajudando um agressor, um país que nega o cumprimento do direito internacional. Desde 1947, inclusive quando (o brasileiro) Oswaldo Aranha era presidente da Assembleia Geral (da ONU), se pretendia criar dois estados. Por que não foi criado outro estado e só foi criado um, que é Israel? Simplesmente porque Israel, com apoio de algumas potências ocidentais, estava impedindo isso. Agora, simplesmente [são os] Estados Unidos e Israel, com mais alguns países.
O responsável deste episódio, de todas as guerras ao longo desses anos é, em grande parte, a comunidade internacional, que não fez respeitar sua determinação. Simplesmente, com cada agressão, não obrigava Israel a cumprir com o direito internacional e Israel se sentiu livre de seguir cometendo crimes e mais crimes e massacres.
A comunidade internacional que me refiro é o Ocidente e não os países que eram colonizados. O Ocidente que é responsável. Ele que deixou as mãos abertas para Israel seguir fazendo o que está fazendo e levar ao povo palestino a um estado de desespero.
Agência Brasil: O governo de Israel e atores que defendem que Israel estaria em seu direito de defesa alegam que, como Hamas defende a extinção do Estado de Israel, isso impediria um acordo para um Estado Palestino ou para o fim das hostilidades. Como o senhor responde a esse argumento?
Alzeben: O Estado de Israel foi criado em 1948. Até 1987, quando foi criado o Hamas, por que ele não cumpriu com suas obrigações internacionais? Em 1948, 1956, 1967, 1973, não existia o Hamas. Quem é responsável por isso são os sucessivos governos de Israel, que levaram à criação de várias organizações, inclusive, e de criar essas situações beligerantes que comprometem nossas vidas diárias, que compromete a paz na região, que comprometem nossa própria existência. Desde 1948 até o momento, quem está impedindo o cumprimento do direito internacional é o próprio [Estado de] Israel, acompanhado dos Estados Unidos e algumas potências ocidentais.
Agência Brasil: Qual, então, seria a saída viável para o fim das hostilidades que estão acontecendo?
Alzeben: Intervenção imediata do Conselho de Segurança (da ONU), com apoio da comunidade internacional, daquelas potências ocidentais. Os Estados Unidos devem ordenar o fim das hostilidades no lugar de mandar armamentos. Ele deve ordenar o fim do bombardeio e vamos nos sentar com todos os atores da região e por fim a essa tragédia que está comprometendo não somente a paz na Palestina e em Israel, mas a paz na região. E eu acho que é uma ameaça direta à paz mundial.
Edição: Valéria Aguiar
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