AVENTURAS A BORDO DAS YAMAHA MINI-ENDURO…

Foram experiências inesquecíveis, que serão contadas em alguns capítulos. Eis o primeiro... Por João Carlos de Queiroz

CAPÍTULO 01 – Uma motocicleta Yamaha mini-enduro, 50 cilindradas, cor laranja, foi meu transporte regular durante anos em Montes Claros, berço natal. Utilizava-a diariamente para entregar correspondências da Reitoria da Fundação Norte Mineira de Ensino Superior, primeiro emprego oficial, hoje qualificado de “Menor Aprendiz”.

Antes de adquirir essa moto, eu utilizava uma bicicleta, jornada bem cansativa. Até suspirava de desânimo quando o rol de ofícios era endereçado à Faculdade de Medicina, no bairro Todos os Santos: unidade educacional distante e repleta de trechos íngremes.

Não poucas vezes, quando lia a correspondência e comprovava não conter nenhum valor documental, apenas meros convites de festas, jogava tudo no Rio Vieira. Divertia-me às pampas ao ver a correnteza engolfar aquele entulho de cartas. Atitude de clara irresponsabilidade adolescente…

Na Reitoria, a mini-enduro ficava encostada quase ao pé da escadaria. Ao final do expediente, já saía dali direto para curtir o início da noite com outros motoqueiros adolescentes da city. Mesmo sem internet e redes sociais, sempre conseguíamos marcar encontro coletivo em questão de minutos, passando a perambular pelo centro e bairros da então pacata cidade.

A liderança do grupo se alternava conforme a ousadia de algumas manobras motociclísticas. Tornei-me mestre em empinar a moto por metros seguidos, ou efetuar curvas deitadas, praticamente “riscando” o asfalto e levantando faíscas. Ainda hoje penso como não levei vários tombos…

Naquela época, anos 70, o número de motocicletas em Montes Claros era bem reduzido, e os “motoqueiros” circulavam pomposos a bordo de vespas, lambretas e Java(s), concentrando-se mais na Praça Coronel Ribeiro. Sempre ia ali para apreciar a movimentação da turma no início da noite.

Por essa mesma época Osmar Borborema adquiriu uma Honda 250, angariando atenção geral antes destinada às lambretas.

A minha mini-enduro laranja foi adquirida em 1974. Antes disso, em 71, eu já experimentara o poder secreto da pequena valente, quando meu mano mais velho montou a primeira concessionária Yamaha na cidade, a Motorama.

Das motos revendidas nessa loja, que logo faliu, sobrou uma mini-enduro amarela, retomada de um comprador pilantra, de nome Laércio. Fazia meses que ele prometera quitar a “compra”. Sempre argumentava estar aguardando receber algum capital de uma tia.

Numa dessas visitas, minha mãe foi enfática: “Pode vir buscar a moto quando estiver com o dinheiro”. E já pediu a meu pai para guardá-la.

Atônito diante daquele fato inesperado, Laércio ousou rebater:

“A senhora não pode fazer isto!” Sempre determinada, minha mãe retorquiu: “Não posso?! E quais são exatamente os seus direitos sobre essa moto?” 

Ela disse isso e cruzou os braços de modo desafiador, olhar fixo no espertalhão. Uma vez que o malandro não emitiu nenhuma resposta, repetiu a ordem: “Guardem a moto”. Gargalhei prazerosamente ao ver Laércio subir  a Rua Coronel Celestino a pé, bufando de raiva…

A mini-enduro amarela ficou estática lá em casa durante meses, até que finalmente descobri {pois não parava de procurar} onde minha mãe guardava a chave de ignição: dentro da caixa de pó de arroz. Para dificultar, acondicionada nos fundos de sua frasqueira azul escura, espécie de porta-treco.

Não foi fácil deduzir o esconderijo dessa chave, apesar de estar no seu encalço há semanas. Bastava minha mãe sair para ministrar aulas e a procura tinha início…

Muito esperta, ela desconfiou um dia que algo estava errado. “Essa moto parece que estava funcionando… O motor está morno”. Esperto, eu expliquei que a deixei no sol por uns momentos, enquanto lavava o quarto. Desculpa que não colou muito, pois ela quis saber por qual motivo não havia nenhum resquício de umidade no quarto. “Lavou hoje? Você nunca fez isso antes…”

A partir desse dia, o esconderijo da chave da moto foi alterado. Quebrei a cabeça em vão. Não demorou e a mini-enduro embarcou rumo a Belo Horizonte. Fiquei frustrado pela perda da maquininha amarela, pois já me acostumara com seu jeito imponente: empinava fácil, até na segunda marcha.

Mais alguns anos se passaram e fui trabalhar na Reitoria das universidades locais. E qual não foi minha surpresa ao ver uma mini-enduro laranja na loja Valdeir Móveis? Tinha paixão reclusa pela amarelinha que foi embora para BH. Mobilizei esforços para adquiri-la, e consegui.

Comprei-a em meados dos anos 70 na Valdeir Móveis, única loja de elite de Montes Claros. Não revendia apenas mobiliário: era revendedora tradicional também de eletrodomésticos e outros produtos, incluindo bicicletas e motos de potência distinta. Até uma Yamaha 350 – a famosa “tampa de caixão” – vi por lá.

Foi assim que reiniciei minhas aventuras no modelo mini-enduro, sem temer pelo “sumiço da chave”. A pequena servia para facilitar meus deslocamentos de trabalho, passeios locais e nas cidades próximas (Juramento, Coração de Jesus, Engenheiro Navarro).

Além de econômica, minha moto propiciava seguro ingresso em terrenos não propícios a tráfego de máquinas que exigem equilíbrio e alguma força. Costumo, aliás, compará-la com as atuais 50 cilindradas de outras marcas, geralmente fraquíssimas. A mini-enduro transpunha facilmente serras com duas pessoas a bordo, trechos asfaltados e cascalhados; viagens não inferiores a 100 quilômetros.

Tenho nítida na memória muitas dessas viagens, quase escutando o pipocar ritmado do motor dois tempos da mini-enduro. A pequena descarga liberava densa fumaça quando a aceleração estava acima da média, já exigindo mais potência da máquina. E aí saía uma fumaceira danada do modesto escapamento, azulando todo o trecho percorrido. Era importante checar a dosagem de óleo 2 Tempos para evitar essa ocorrência.

 

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