“Pra não Dizer que Não Falei das Flores…”

Eis uma das músicas mais lindas já compostas em terras brasileiras. Canção que alfineta, sem cerimônias, a alma de qualquer ser romântico. Trata-se de uma obra-prima do compositor Geraldo Vandré.

Na realidade, ao ‘falar das flores’, Vandré estabelece franca conexão musical à de um pensador inconformado com os destinos da Nação.

“Pra Não dizer que Não Falei das Flores” acopla-se, assim, harmoniosamente a qualquer época de nostalgia: não importa se de jovens, adultos ou idosos. É fonte de encantamento prodigioso.

Vandré incomodou muito o extremismo violento da ditadura militar, nos anos, 60 ao falar das flores. Mais ainda: fustigou almas sensíveis, presentes em distintas camadas da sociedade; elevou projeções reais [de felicidade] a planos místicos, porém palpáveis.

Músicas desse quilate encampam preciosidade inestimável; estabelecem valores concretos a tudo que prospectamos sonhar.

A genialidade avançada dos compositores geralmente comporta inteligentes mensagens dúbias [letras], sobrepondo-se ao arsenal instrumentista. Complementa a magia, sob a batuta de maestro invisível, de enlevo inebriante…

Outro sucesso popular…

“Tá vendo aquele edifício, moço?”, interpretada pelo gênio Zé Ramalho, autor, é outro exemplo do impacto que certas composições estabelecem em nossas vidas. São músicas que fustigam recônditos de almas empedradas, liberando-as para partirem rumo à revitalização do amor, da busca pela essência máxima de felicidade.

Os tesouros musicais de um ontem perpétuo, em síntese, não têm fim, a exemplo de “Astronautas de mármore” (interpretada pelo saudoso conjunto Nenhum de Nós), “Pavão Misterioso” (Ednardo), e um sem número de composições.

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Músicas do tipo proporcionam enlevo aconchegante a almas resistentes ao chamamento da paixão, guarnecidas por couraça de frieza total.

A maioria dos resistentes ao amor se encontra desgarrada de sensibilidade pela incursão forçosa no mundo material.

Ou seja: não há tempo para fraquezas mundanas; subentende-se que a música possa ser alternativa corrosiva a objetivos práticos.

ENFIM…

Nem sei por qual motivo falei hoje de música, sendo, com certeza minha primeira inserção em tal tema. Primeiro, não entendo nada da área musical; e tampouco tenho afinidade pelo tema, ao contrário do amigo Afonso Celso Magalhães Ferreira, músico inveterado. Rs…

Afonso é essencialmente musical: adotou ritual de degustação de vinho e queijo no seu quase estúdio particular, em Brasília-DF. Sexta-feira é o dia D. E entre uma música e outra, com direito a Beto Guedes, o amigo viaja longe na imaginação…

Volta e meia, ainda dedilha melodias afinadas no violão, instrumento que congrega imponente porte de troféu em sua espaçosa sala.

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O certo é que músicas detêm poder letárgico: alquebram dores e as revitalizam de forma apaixonada. Seja qual for o instrumento, ou fonte geradora, lá se vai pelo espaço projeções conflitantes, alternando ontem, presente e futuro.

Uma persistente recordação – ligada à música – é a dos discos de vinil, associadas a vitrolas em rotação veloz. Técnicos batem o pé dizendo que a fidelidade musical do vinil é insuperável.

Também não dá pra esquecer os memoráveis toca-fitas veiculares, fitas do tamanho das utilizadas antigamente em filmadoras.

Meu mano mais velho, Zé Antônio, tinha um desses equipamentos no velho fusca 78, e eu percebia seu ar feliz ao escancarar o som gerado pelos cartuchos que colecionava.

Naquela época, anos 70, ter um toca-fitas semelhante significava status, pois o equipamento despertava cobiça coletiva. Tanto que o do mano foi furtado, para seu desespero. Terminou descobrindo depois o autor do golpe, pessoa em quem confiava.

Por João Carlos de Queiroz, jornalista