Pires e Albuquerque: terra de ilusões encantadoras e de puro assombro…

Pires e Albuquerque: terra de ilusões encantadoras e de puro assombro…
 
Bem ali, pertinho de Montes Claros-MG, entre morrotes, está situada a antiga estação de Pires e Albuquerque, atual Alto Belo, distrito bocaiuvense. Restou pouca coisa desse terminal ferroviário, atualmente com tímidos escombros quase escondidos pela mata. Mas, desde então, a partir dos anos 90, inúmeras casas eclodiram confiantes no seu entorno, descortinando sede progressista do povoado mineiro.
 
A própria linha da R.F.F.S.A. continua intacta, talvez sinalizando um “posso voltar a fazer barulho por aqui”. Infelizmente, muito tempo já transcorreu desde então, e uma implacável ferrugem se instalou nos antes reluzentes trilhos, cujo brilho simbolizava emoções dos viajantes e dos que deles se despediam. Sobraram cenas gravadas na imortalidade saudosa dos moradores…
 
Nunca entendi, também, o porquê de terem mudado o popular nome {Pires e Albuquerque} para Alto Belo; terra que sediou nascimento de grande parte dos componentes da família Queiroz e de outras destacadas do município.
 
Pela dispersão natural de sobrevivência, com cada um buscando seu melhor canto, vários integrantes da mesma família abriram seus olhos em lugares dispersos do município.
 
A maior parte da prole Queiroz já deixou Pires para “cumprimentar Deus”. Alguns, em função da idade, se encontram alienados do mundo, acometidos por doenças comuns em velhices sofríveis. Mas, ainda assim, espantoso, curtem netos e conseguem sorrir durante as comemorações familiares e religiosas…
 
Meu pai, Carlos Petronilho de Queiroz, também acordou para a vida em Pires e Albuquerque, e durante anos e anos andou a pé e a cavalo pela região adjacente, repleta de pequenas chácaras e sítios. Na cintura, uma baita garrucha. Muitos o temiam por isso…
 
Nas férias escolares, e quando eu ainda era quase bebê, eu era levado para curtir o Rio Verde em Pires. O manancial ficava logo abaixo da casa dos primos Nem e Zezé.
 
Foram as férias mais espetaculares da minha vida. Rememoro o carinho dos tios Nina e Ambrósio para me agradar ao máximo. Incentivado por eles, sempre tomava leite quente no curral, ou ainda auxiliava os primos a catar pequi e outras frutas, mata afora. Não raramente, queria auxiliar na produção de rapaduras.
 
Pires, portanto, é um dos focos prediletos das minhas narrativas acerca de lobisomens, assombrações e similares; povoado inserido respeitosamente no arsenal de lendas cultivadas pelo povo mineiro.
 
Eis o motivo pelo qual falo tanto de Pires, realmente merecedor de ser emancipado e transformado em município. Téo Azevedo e Feliciano Souza, moradores ilustres, certamente que aplaudiriam tal iniciativa política…
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É preciso, veja vem, fazer um discernimento sobre o Pires de ontem e o de hoje. Isso porque o asfalto das ruas e a luz {que substituiu lamparinas} não conseguiram extirpar os mistérios dessa terra tão encantadora.
 
Assim, não será nenhum espanto se, vez ou outra, moradores jurarem que o Trem Azul passou rápido pela frente do que restou da plataforma da velha estação. Ou dizer que continuam escutando seu buzinaço e tremor pesado todas as madrugadas.
 
ENFIM, para quem tanto pôde degustar o dia a dia do ato de viver numa comunidade simplória tão aconchegante, as lembranças de um ontem feliz se tornaram esboços sólidos de sonhos aguardados.
 
E há quem ainda aposte (em Pires) que tudo pode voltar a ser como antes, e que a ferrugem atual dos trilhos seja neutralizada pelas rodas da passagem regular de composições ferroviárias, seja de cor azul ou de qualquer cor.
 
Afinal, o trem da esperança ainda é aguardado por quantos moram lá!
 
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Deixo para contar depois alguns “causos” que ouvi do meu pai, tios e primos. Nem eu acreditava, a princípio. Mas, depois de ter estado lá, em Pires, e por muitas e muitas vezes, posso assegurar: são verídicos. Ainda nem terminei de falar das aventuras do alfaiate lobisomem…
 
Por João Carlos de Queiroz