Os meninos bruxos do Colégio Marista São José…

{PARTE 5}
Montes Claros-MG – O que deveria ser mais uma aula tranquila no Colégio Marista São José, para aquela turminha do “apronta-tudo”, idos dos anos 70, significava somente o início de travessuras impensáveis; algumas, aliás, até bem divertidas…
Bastava a campainha da escola convocar todos à sala para alguma coisa eclodir de surpresa perante os inocentes colegas e professores, gerando pânico geral. Por vezes, ouvia-se um rol de risadas deliciosas, algumas procedentes dos não participantes da referida aprontação…
Quando digo eclodir, refiro-me inclusive a bombas “plantadas” nos banheiros, localizados no corredor inferior. O eco dos estouros bombardeava tímpanos sensíveis por vários minutos, entremeado por gargalhadas prazerosas.
Já ciente de que aprontações semelhantes foram planejadas na nossa sala, os professores mantinham-se seriamente postados no tablado, à espera de explicações {que nunca aconteciam}. Passávamos, então, a ser anjos angelicais, totalmente descomprometidos com essas ações, genuinamente pérfidas…
Apesar dos anos transcorridos, ainda recordo do olhar magoado dos professores em frente ao quadro negro. O tablado frouxo rangia a cada movimento nervoso dos mestres. Só queriam saber quem fez aquilo…
Na verdade, mesmo essas molecagens exigiam certa técnica. Por exemplo: as bombas 500, as “gordinhas”, eram afixadas com fita crepe no vão das paredes dos sanitários, na parte alta. Um cigarro aceso acenderia o estopim, desencadeando sonoro estouro. Não queríamos ferir ninguém, apenas assustar.
Também praticamos desligamentos da chave de energia elétrica do auditório do colégio, aproveitando esticada rápida ao banheiro para fazer isso. Álibi perfeito: só tínhamos que ser ágeis para retornar à sala sem gerar nenhuma desconfiança. Isso durou algum tempo…
Já de volta à sala, ouvíamos todo o estardalhaço de corre-corre de pessoas no corredor superior, franco burburinho dos que se aglomeravam no amplo salão, seja assistindo filmes, peças teatrais, ou simplesmente participando de reuniões promovidas pela diretoria.
Ar carrancudo, de cobrança, de há muito desconfiados que os bruxinhos eram seus alunos, nossos professores perguntavam impacientes qual foi o engraçadinho que desligou a energia do salão. Nenhuma resposta, claro…
Mantínhamos-nos então espertamente no anonimato, sempre entreolhando curiosos ao redor, como se também desejávamos saber quem foi capaz de tamanha aprontação…
Alguns colegas, lógico, conheciam nosso segredo, e um ou outro sibilava olhares de clara ameaça de nos entregar, temendo ser arrolados como cúmplices ou participantes diretos de tal traquinagem. Felizmente, nunca passou disso…
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Ainda liberamos, durante as aulas no Colégio São José, o famoso “peido alemão”, carniça protagonizada a partir de mistura de pó de fio de TV e cola arábica. Ao acender o cordão (untado com essas substâncias), um insuportável odor infestava o ambiente inteiro, inviabilizando a continuidade das aulas. Assemelhava-se a uma pocilga, pra lá de imunda…
A professora de Ciências, Dorinha, nos olhou ternamente compadecida quando a sala foi bombardeada pelo fétido odor, informando que iria solicitar a interrupção das aulas por falta de condições de higiene. “Gente! Vamos ter que deixar nossa aula para um outro dia!”
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POR TEMPO IMPRECISO, os bruxinhos peraltas do Colégio Marista São José se mantiveram desconhecidos perante a diretoria. Malandros, temíamos represálias (expulsão, por exemplo) por parte do diretor da escola, Irmão Ladislau, conhecido pela sua inflexibilidade.
Esse sisudo diretor, ainda devo salientar, se assemelhava a um bruxo, materializando-se em todos os lugares, de forma quase que simultânea. Avaliação feita pela amiga escritora e ex-aluna, a intelectual Míriam Maciel. Como Ladislau fazia isso, sinceramente eu não sei. Míriam também nem tem ideia…
Muito magro, Ladislau quase levitava ao andar rápido, aparentemente correndo para resolver algo urgente. Cheguei a imaginar, em algumas ocasiões, a possibilidade de ele dispor de sósias locais, réplicas parceiras para implementar molde rigoroso e eficiente de administração no colégio. Afinal, Ladislau era apenas uma pessoa… Isto é: se não se transmutou em várias…
AINDA SOBRE LADISLAU…
Homem de poucas palavras, o dedicado diretor exibia atentos olhos repuxados, impondo respeitoso acatamento normativo ao funcionamento do Colégio.
Estar ali, dirigir aquele conceituado educandário religioso, óbvio, implicava em total motivação do seu existir. Sentia-se feliz sendo diretor e poder comandar tudo com maestria.
Pela autoridade irretocável desse inesquecível diretor, exemplo que deveria ser seguido por outros sucessores, os bruxinhos do Colégio São José não puderam aprontar tudo que desejavam, curvando-se finalmente às rígidas regras da tradicional escola. Ainda bem.
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*Os colégios maristas sublinham referência educacional em vários polos do Brasil e em outros países. Quem teve a honra de estudar num deles, é fato, pode se sentir privilegiado. Sinto-me assim.
João Carlos de Queiroz