Os fantasmas do Palácio Alencastro assombram qualquer um…

Sede da Prefeitura de Cuiabá já sediou unidade do DOPS; muitos presos foram torturados e mortos ali, dizem historiadores

Trabalhei por bom tempo na sede da Prefeitura de Cuiabá, mais especificamente na Secretaria de Comunicação Social. Trata-se de um prédio antigo, mais conhecido como Palácio Alencastro, sediado na praça central da capital. Aliás, o nome Alencastro é justamente por causa da praça…

É um imóvel que causa arrepios a quem conhece suas histórias, sejam reais e/ou fictícias. Mas estão interligadas, por assim dizer: é que os mortos, de passado distante, viraram assombrações, e têm andado à vontade pelos corredores e pátio de estacionamento, em horários imprecisos.

Para se inteirar melhor disso, basta conversar com os servidores municipais veteranos. Cada um tem narrativas arrepiantes a respeito da trajetória fantasmagórica do velho edifício, há décadas comportando a sede da Municipalidade. Sabe-se que nem sempre foi um lugar tranquilo…

Nos tempos da ditadura, o referido prédio [de sete andares] sediou violenta unidade do DOPS – Delegacia Política e de Ordem Social. Vários detentos morreram sob tortura no denominado “porão” [subsolo], à base de pancadaria ou “pau de arara”.

Só fui acreditar nisso após conversar com dois policiais aposentados que atuaram nessa unidade cuiabana do DOPS. Estranhamente, um deles virou chacareiro simpático, casa aconchegante instalada nas proximidades da Serra de São Vicente. Por questões óbvias, omitirei seu nome.

Visitei-o algumas vezes, porém sempre recusando convites de pernoite. Segundo ele, o fantasma do antigo proprietário trabalhava duro na carpintaria, noite adentro. Isso foi suficiente para não aceitar dormir por lá…

O ex-policial narrou também um caso em que diz ter sido um dos protagonistas de hedionda tortura. Ouvi meio cético, sem acreditar muito…

Segundo disse em tom indiferente, torturas eram comuns no prédio do DOPS, e eles apenas seguiam ordens superiores.

“Uma ocasião, deixamos um cara dependurado no “pau de arara”, na salinha do subsolo, e fomos tomar cerveja num boteco da prainha, ao lado do Morro da Luz. Era quase hora de almoço e, entre uma cervejinha e outra, o papo rendeu bastante, e as horas também…”

Lá pelas 1t5h, já meio tontos, finalmente eles se lembraram do sujeito que deixaram de cabeça pra baixo no porão do DOPS, e retornaram às pressas, prevendo o pior. Infelizmente, já acontecera o temido:

“O homem havia morrido, e exibia língua inchada e olhos imensos, quase saindo das órbitas, em face da pressão sanguínea na cabeça. Era um homem branco, mas parecia ter ficado negro”.

Ao contar isso pausadamente, imaginei que pudesse ter algum remorso. No entanto, depois de concluir o relato, ele repetiu sem ênfase: “Cumpríamos ordens”.

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Os vigilantes do Palácio Alencastro contam, até hoje, presenciar vultos correndo rumo ao porão do prédio, altas horas da noite. No início, eles até se davam ao trabalho de ir averiguar quem poderia ser, mas nunca encontravam ninguém. Atualmente, nem ligam mais…

Eu fui trabalhar na SECOM após saber dessas histórias, e realmente fiquei com a pulga atrás da orelha. Assessor direto do então prefeito Wilson Santos, por vezes o acompanhava em pautas longas, tarde afora, e assim precisava redigir o material já fora do expediente, entre às 19 e 22h. A notícia não pode caducar.

Numa dessas noites, eu e o fotógrafo Walter Machado éramos os únicos trabalhando no sexto andar do prédio, redação da SECOM. De repente, pela porta aberta, vi passando um vulto estranho, sem rosto, quase flutuando, em direção aos elevadores. Por pouco não derrubei a cadeira de susto, dando de cara com o fotógrafo já de pé, balbuciando:

“Você viu algo, João, você viu… – ficou repetindo. E acrescentou: “Também senti uma coisa estranha acontecendo; só não vi. Meu corpo está todo arrepiado”.

Corremos até os elevadores e – pasmem! – não encontramos ninguém. Eu tive tal intuição.

Esse foi apenas um dos episódios sinistros no Palácio Alencastro no horário noturno, pois em outros, quando estava sozinho na redação, ouvia as divisórias serem esmurradas várias vezes por alguém invisível.

Nem preciso dizer que não conseguia, a partir daí, digitar mais nada, saindo correndo da sala…

No entanto, o sucedido mais aterrador aconteceu em pleno dia, num sábado, quando fui redigir o material coletado durante a noite, em evento de entrega de títulos fundiários.

Cheguei à SECOM às 8h, subindo direto para a redação, pois planejava sair em uma hora, no máximo. Elaborar textos jornalísticos é tarefa fácil, bastando dedilhar os dados anotados.

No meio da confecção da primeira matéria, pauta  que dividi em três partes, fui ao banheiro para lavar o rosto, a fim de espantar sonolência insistente. Que falta fazia um café!

Não havia papel toalha na ala masculina, e ciente de que o prédio estava vazio, poderia filar, sem problemas, umas folhas no banheiro feminino, bem ao lado.

Mal entrei, percebi que as luzes estavam acesas, e vislumbrei um par de sapatos vermelhos se sobressaindo no vão inferior de um dos sanitários. Estava ocupado por alguém!

– Licença, senhora, só vou pegar um papel toalha, já estou saindo… – disse.

Puxei o papel do rolo e saí rápido. Ao deixar o recinto masculino, flagrei um vulto feminino virando o corredor e, o mais incrível, as luzes do banheiro feminino sendo apagadas automaticamente! Como podia aquilo?!

Dirigi-me à ala de elevadores, supondo encontrar alguma faxineira prestando serviços no Palácio Alencastro naquele dia. Tudo deserto; lembrei-me então do vulto sem rosto, que vi passando em frente à redação meses antes…

Tal constatação mexeu com meus nervos, e desci rápido para questionar o porteiro sobre quem mais estava no prédio. O homem me olhou sem entender, a princípio, e respondeu que apenas eu e ele.

Falei da mulher dos sapatos vermelhos e ele riu pacas, dizendo pra não inventar coisas. Insisti e o vigilante subiu comigo ao sexto andar, indo checar o banheiro feminino.

Para minha surpresa, a porta do sanitário [aquele supostamente ocupado pela mulher] estava lacrada, ostentando aviso de manutenção. O porteiro fez um gesto de interrogação divertida, e me contou mais alguns episódios preocupantes do Alencastro…

– Depois das 18h, tem uma idosa descabelada que anda por tudo quanto é andar desse prédio. E após à meia-noite, os elevadores começam a subir e descer sozinhos, sempre parando no sexto andar. É um sobe e desce esquisito demais!

Só para encerrar: um desses elevadores foi palco de assassinato de ascensorista, encontrado esfaqueado ao chegar ao térreo. Ao embarcar sozinho no dito elevador, eu sentia o corpo estremecer de pavor, mantendo-me colado à parede. Segundo diziam, o homem jazia morto bem no meio…

Por JCQ