Os anos-criança ainda latejam saudosos na minha mente. É quando retrocedo a vários bons momentos, entre eles, as primeiras lições escolares no Grupo Quita Pereira, situado na Avenida João XXIII, via de acesso a várias cidades ribeirinhas (São Francisco, Januária, Manga, etc…).
Durante décadas, esse simplório educandário infantil foi mantido eficientemente pela direção da fábrica de óleo de mamona e ração, empresa do Grupo Irmãos Pereira. Ali estudaram filhos dos funcionários da fábrica e crianças carentes. Iniciativa belíssima!
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No Quita Pereira, a hora mais aguardada era a do recreio, vislumbrando-se notória impaciência nos olhos das crianças. Não somente mantinham olhar fixo no relógio-cuco da sala, como indagavam ininterruptamente dos professores se faltava muito para o lanche…
Alguns colegas evidenciavam tristeza angustiada no olhar, desatentos à aula. Anos mais tarde compreendi o motivo: a merenda escolar significava sua única refeição diária. Um dos coleguinhas me confessou isso.
– Lá em casa nunca tem nada pra comer… Sonho sempre comendo pão e tomando mingau”, disse simplesmente.
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POR CONSEGUINTE, mal a sirene anunciava o recreio, lá vinha um turbilhão de crianças correndo rumo à cantina. Ninguém queria ficar por último na fila, sob risco de a merenda acabar repentinamente.
– Não temos mais mingau, crianças… Mas, se alguém ainda quiser pão sem queijo… – ouvi as merendeiras anunciarem repetidamente, voz compadecida.
Por várias vezes, também detive mordidas no lanche para observar a gula desmedidas dos coleguinhas carentes, os mencionados ‘estômagos vazios’. Posicionavam-se sempre nervosos na fila, temor de nada receber no janelão da cozinha…
Para as crianças carentes do Grupo Quita Pereira, ter em mãos um copo de mingau de fubá e um pedaço de pão, tendo ao centro uma fatia de queijo, significava a própria subsistência. Uma conquista e tanto poder merendar!
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AINDA tínhamos cineminha no Quita Pereira, filmes mudos, à base de eslaides. As professoras protagonizavam função de dubladoras das falas do lobo-mau e dos Três Porquinhos. Essas eram as histórias mais solicitadas pelas turmas, projetadas num lençol estirado no quadro-negro.
A cada sessão, as professoras fechavam as cortinas das janelas, e sem ventilador para arejar o ambiente, o calor tomava conta. Alguns colegas ficavam empapados de suor; mas nunca nos queixamos, ansiosos para ver os filmes.
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O Grupo Escolar Quita Pereira é, resumidamente, uma preciosa referência nas minhas ocasionais lembranças dos tempos infantis. A dedicação dos professores e demais funcionários impressionava. Difícil esquecer a diretora Yolanda Pereira supervisionando tudo…
Só fui compreender a exata importância dessa escolinha na fase adolescente, quando finalmente soube que lá me serviram muito mais do que pão com queijo e mingau de fubá: esbaldei-me em útil aprendizado de vida!
Por João Carlos de Queiroz, jornalista