Em Coxins-MT, dizem que um amaldiçoado infernizou a vida de sitiantes por décadas. Mal o Sol desaparecia na linha do horizonte, cedendo lugar ao deleite do silêncio noturno, ouvia-se estardalhaço incontido nas entranhas da mata.
– Ora uivava, ora zurrava ruidosamente – diziam. – E roncava alto!
Aí, era preciso trancar bem portas e janelas, passando ferrolho. Toda casa de sítio tinha portas assim, com trancas reforçadas.
O danado incomodava a todos, madrugada afora… – relembra Ernesto Souza, sitiante do lugar.
Acrescentou que o gargalhar profano nem podia ser descrito com exatidão, mesclando-se a sons distintos. O roncar agudo se sobressaía.
– Não dava mesmo para distinguir direito aquilo, segundo Souza.
– Eu não recordo nada: apenas do corre-corre geral para trancar portas e janelas. E pedidos para ficarmos quietos, em silêncio…
Por não ter estudos, Souza permaneceu morando na casa após o falecimento dos pais, enquanto seus irmãos partiram.
– Prevaleceu a cisma: e se o bichão voltar? Assim, costumo trancar bem a casa toda, antes de dormir. E fico assuntando por minutos, no aguardo do sono. Qualquer sinal de passos arrastados já pego a espingarda…
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Outros sitiantes acalentam recordações arrepiantes a respeito desse andarilho das trevas. Alguns afirmam que ele anda por Coxins até hoje, mas de forma comedida.
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O “Roncador”, conforme foi apelidado, surgiu depois de crime hediondo envolvendo irmãos; a suspeita é de que o criminoso vaga inquietamente, transfigurado em monstro.
Para os sitiantes, ele virou é lobisomem, pois tem altura superior a dois metros. Mais: possui corpo coberto por pelos e queixada avantajada. As descrições “batem” quase identicamente.
Pelo sim, pelo não, o “Roncador” botou pescadores e caçadores pra correr da região de matas de Coxins. Um deles, teimoso, contam, insistiu em armar tocaia, apesar de ter sido avisado para ficar em casa.
Lá pela meia-noite, enquanto tocaiava em cima de árvore, avistou um lobo enorme empacar logo abaixo. Seu medo foi de que o peludão subisse na árvore, descobrindo-o entre a galhada. Seria o seu fim…
Em dado momento, sem parar de ziguezaguear, o danado uivou altíssimo, olhando diretamente em sua direção.
Possivelmente com as calças borradas, o caçador não sabe dizer se chegou a ser descoberto, no meio da folhagem. Porém, nunca esqueceu os enormes olhos sanguinolentos brilhando ao luar…
“GRITADOR” É OUTRO SINISTRO QUE ASSOMBROU OS MORADORES DE SÍTIOS
Meu amigo escritor, Afonso Celso Magalhães Ferreira, contou ter ouvido dos parentes mineiros algo parecido, fatos supostamente transcorridos em passado distante.
Só os nomes diferem: o andarilho noturno de MG era chamado de “Gritador”. Isso porque o alucinado gritava, ao invés de uivar ou roncar.
Cada visita não consentida culminava em arranhões profundos na madeira rústica das casas, deixando todos apavorados, disse Afonso.
O escritor atribui que tudo pode ser crendice popular; só não descarta que também possa ter alguma veracidade…
– Seja o que for, era bem forte: invadia os terrenos da área rural e forçava portas e janelas. Arranhava tudo freneticamente; o imóvel chegava a estremecer. Todo mundo sabia ser o “Gritador”.
NA VERDADE, tipos sem descanso eterno vagam por tudo quanto é lugar. Integram-se ao rol de assombrações.
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O caso de “ZECA GIRANO” [Montes Claros-MG], amaldiçoado pela mãe com mão de pilão, é igualmente famoso no rol de lendas populares. Qualquer dia volto a falar dele novamente…
Por João Carlos de Queiroz, jornalista Mtb 381.18-MT