Imprensa STF – O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a adoção de diversas medidas em favor de adolescentes que se encontram na Unidade de Internação Regional Norte (Uninorte), localizada em Linhares (ES). Na decisão tomada no Habeas Corpus (HC) 143988, o ministro delimita em 119% a taxa de ocupação na Uninorte e determina a transferência dos adolescentes excedentes para outras unidades que não estejam com capacidade de ocupação superior à taxa fixada.
Ainda de acordo com o ministro, caso a transferência não seja possível, o magistrado de primeira instância deverá atender ao parâmetro fixado no artigo 49, inciso II, da Lei 12.594/2012, até que seja atingido o percentual máximo de ocupação fixado. O dispositivo assegura ao adolescente o direito de ser incluído em programa de meio aberto quando inexistir vaga para o cumprimento de medida de privação da liberdade, exceto nos casos de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa. Na hipótese de impossibilidade de adoção dessas providências, Fachin autorizou que se convertam em domiciliares as medidas socioeducativas de internações.
A decisão liminar do ministro acolhe pedido apresentado pela Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPE-ES) em favor dos adolescentes sujeitos ao cumprimento das medidas socioeducativas de internação na Uninorte. Em novembro de 2017, o relator havia rejeitado o trâmite do HC, porém reconsiderou sua decisão em razão de julgamentos mais recentes sobre a matéria e dos argumentos apresentados em recurso (agravo regimental) interposto pela DPE-ES.
A Defensoria noticia a existência de uma série de condições que violam a dignidade da pessoa humana, dentre elas a superlotação, que motiva rebeliões e motins, e a não separação dos internos por idade ou tipo de ato infracional cometido. Denuncia ainda reiteradas agressões, maus-tratos e tortura dos internos por parte de agentes socioeducativos, revelando quadro de violação dos direitos humanos. Narra que a notícia de adolescente internado na Uninorte gravemente ferido no pescoço resultou em nota pública do Comitê Estadual para a Prevenção e Erradicação de Tortura no Espirito Santo. Ainda segundo a DPE-ES, outras vias foram utilizadas para o enfrentamento da matéria, porém todas sem sucesso, revelando-se assim o habeas corpus coletivo como última alternativa.
Decisão
Ao reconsiderar decisão anterior, o ministro Edson Fachin citou julgamentos semelhantes e recentes, a exemplo do HC 143641, realizado no dia 20 de fevereiro deste ano, quando a Segunda Turma do STF admitiu habeas corpus coletivo para discutir direitos individuais homogêneos e concedeu o HC em favor de gestantes e mães de filhos com até doze anos presas preventivamente.
No caso dos autos, o relator entendeu que os direitos fundamentais dos adolescentes permanecem violados pela ocupação acima da capacidade projetada e dos limites da razoabilidade e ressaltou que eles não podem permanecer na situação degradante em que se encontram. Segundo o relator, dados constantes nos autos demonstram que, de 2015 a 2017, a superlotação é recorrente na unidade, atingindo, em fevereiro de 2016, a ocupação de 251 adolescentes, para um total de 90 vagas. “Há informações de que adolescentes internos dormem em colchões no chão, inclusive próximo do vaso sanitário, por não haver camas em número suficiente”, observou.
De acordo com o ministro, a manutenção dessa situação revela afronta ao artigo 227 da Constituição Federal, que prevê a proteção prioritária dos direitos e garantias das crianças e adolescentes. Ele destacou que o princípio da dignidade da pessoa humana está presente em todo o ordenamento jurídico e é concretizado no Estatuto da Criança e do Adolescente, segundo o qual o adolescente privado de liberdade tem direito de ser tratado com respeito e dignidade. “As medidas socioeducativas privativas de liberdade deverão ser cumpridas em estabelecimentos que ofereçam dignas condições, em respeito à sua peculiar situação de pessoa em desenvolvimento”, afirmou.
O ministro Fachin lembrou que a solução sugerida pela Defensoria Pública no sentido de aplicar percentual para a fixação de limite de internos “é a que melhor se ajusta para minimizar e estabilizar o quadro preocupante”. Ele explicou que o percentual de 119% é extraído da taxa média de ocupação dos internos de 16 estados, aferido pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em 2013. “Por ora, por ausência de outros parâmetros, compreendo razoável o índice informado na exordial [petição inicial]”, ressaltou.
Na decisão, o relator também deferiu pedido de ingresso no caso das entidades Conectas Direitos Humanos, Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e Instituto Alana na condição de amigos da Corte (amici curiae). “O debate apresenta pertinência com as relevantes atribuições das organizações civis, as quais têm potencial para enriquecer a discussão quanto à experiência de seus representados com restrição de liberdade”, ressaltou.
O ministro ainda requisitou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) informações sobre a taxa média de ocupação nas unidades de execução de medida socioeducativa de internação dos estados. Por fim, determinou ainda que o juiz da execução para a medida socioeducativa informe, no prazo de até 30 dias, pormenorizadamente, sobre o cumprimento da decisão ora proferida.
EC/AD
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03/11/2017 – Rejeitado trâmite de HC da Defensoria Pública do ES em favor de adolescentes internos