PARTE 02
O Jornal do Norte passou a ser um dos pontos de curiosidade coletiva dos moradores de Montes Claros. Sabiam o quanto aquele veículo de imprensa era competente e moderno, na arte de bem-informar.
Quem ali chegasse, encostando-se ao murinho baixo do casarão azul e branco da Matriz, já escutava barulho ininterrupto de máquinas de datilografia em sincronia desordenada de ação. As notícias estavam sendo produzidas em escala dinâmica.
Às primeiras horas do dia seguinte, os leitores teriam acesso ao fruto desse dedilhar fervoroso de notícias. As edições do Jornal do Norte não faziam pilha de descaso em nenhuma banca, esgotando-se rapidamente.
Os curiosos não paravam por aí, e por vezes adentravam na redação do jornal como quem não quer nada, na realidade ansiando por conhecer a mágica noticiosa em curso.
Tornou-se comum, assim, um entra e sai de gente conhecida e estranhos no velho casarão, sobe e desce constante de escadas, durante todo o dia…
Realeza no setor gráfico
A gráfica do Jornal do Norte impôs respeito perante o restante dos jornais locais pela rapidez com que levava a efeito as impressões. Se a impressão não saía conforme o desejado, borrando textos e fotos, os gráficos faziam ajustes precisos no maquinário.
Impressionante a dedicação de dois deles, Anselmo e Tião, linotipistas consagrados em Montes Claros, em manter aquelas máquinas sempre impecáveis, o que permitia impressão nítida e a contento da diretoria e editoria-geral.
Os linotipistas em questão nunca saíam do jornal, e houve época que pensei também dormirem ali, pois já os encontrava ao chegar e ao sair. Ainda imaginei que deviam se dedicar minimamente à família, zerando qualquer lazer.
Pela expressão compenetrada de ambos, ao andar pra lá e pra cá em vigília constante para garantir total perfeição, soube que o Jornal do Norte contava com dois excelentes gráficos.
Outro detalhe: ostentavam típica cara sonolenta, algo irritadiça, sobressaindo reflexos naturais de forçada insônia. Não sei como aguentavam aquele batente…
Anselmo e Tião podem ser considerados heróis do mundo gráfico jornalístico em Montes Claros: atuaram em outros matutinos com competência idêntica. Sua única preocupação era soltar as edições do Jornal do Norte dentro do prazo e com a qualidade solicitada pela diretoria.
Eu os respeitava imensamente, mal ousando falar com eles sobre questões gráficas, erros que pensava corrigir. Difícil questionar o trabalho de quem conhece ao pé-da-letra seu ofício. Melhor ficar quietinho, colaborando o máximo possível, decidi. Só ousei procurá-los poucas vezes…
João Carlos de Queiroz