PARTE 01
Montes Claros-MG – O Jornal do Norte saiu de circulação há décadas, mas ainda hoje simboliza modernização impecável no jornalismo do Norte de Minas Gerais. Adotou linha redacional revolucionária, impondo estilo inédito, objetivamente audacioso.
O Jornal do Norte, na concepção de expressiva gama dos seus antigos leitores, fluía notícias como uma fonte que jorra água cristalina e confiável. A construção da notícia, portanto, deixava de ser obrigação, assumindo dever prazeroso. Evidente a satisfação de quantos atuavam no saudoso matutino.
Um dos mestres embrionários de toda essa revolução na imprensa norte-mineira, jornalista Robson Costa, procedente do Estadão de São Paulo, infelizmente perdeu a batalha da vida contra o câncer.
Então repórter estreante no Jornal do Norte, captei alguns dos preciosos ensinamentos de Robson Costa. Quanta experiência! Excelente professor!
Outros mestres jornalísticos o precederam, relação escolhida a dedo pelos fundadores do Jornal do Norte, empresários Américo Martins Filho e Antônio Santos. Trabalhei {e também aprendi bastante} com Felipe Gabrich, Leonardo Campos e o professor J. Mathias.
Infelizmente, a parte física do jornal inexiste há décadas: comercializado, o centenário casarão virou escombros. Sobraram apenas as velhas janelas de madeira, palco de preguiçoso bate-papo ocasional dos homens da notícia.
Lá em cima, na redação, postados às janelas, os repórteres impunham descanso contumaz à mente e dedos, em breves intervalos diários.
Os fumantes, em baforadas meditativas, igualavam-se a estátuas similares à de Governador Valadares, monumento imponente do centro da Praça da Matriz.
O cotidiano morno do logradouro público, carinhosamente apelidado de Pracinha da Matriz, sempre foi interessante ao olhar geral…
Recordo, ainda, que o editor Leonardo Campos, entre um trago e outro, alinhava seus imensos cabelos loiros, entremeando carinho de coça-de-leve à barba espessa, visivelmente acinzentada de nicotina. Fumava demais!
Poder-se-dia dizer que, das imensas janelas desse casarão, várias peças teatrais, em formato real, foram protagonizadas à equipe de imprensa do Jornal do Norte.
Lá vem o bispo…
Alguns colegas achavam graça em ver o bispo Dom José Alves Trindade sempre andando rápido em direção ao Palácio Diocesano, situado numa das extremidades da jardinada Matriz. Cada passada do bispo vencia espaços consideráveis nas alamedas da praça.
Apesar do respeito religioso angariado junto à população, Dom José era tido como uma pessoa misteriosa. O bispo nunca foi adepto de conversa fiada, limitando-se ao básico. Isso levantou a orelha de muitos…
Daí, para associá-lo ao Conde Drácula, foi um passo. Deu até para imaginar que, a qualquer momento, poderia virar morcego e voar rumo rumo à torre da Igreja Matriz.
Leonardo nunca comentou nada a respeito, mas olhava detidamente os movimentos do bispo enquanto tragava avidamente seus cigarros. Só deixava o janelão para perguntar se o café estava pronto…
Por João Carlos de Queiroz