João Carlos de Queiroz, jornalista – Conheci e convivi, de perto, com a brilhante garra administradora e simpatia contagiante da ex-professora Isabel Pinto de Campos, mais conhecida carinhosamente como “Loló”. Isso aconteceu no início da década de 90, quando fui entrevistado por ela na diretoria do jornal “O Estado de Mato Grosso”, solicitando uma vaga no quadro de repórteres do matutino. Inicialmente cética quanto à minha capacidade profissional, a professora quis saber o porquê de optar pelo seu jornal, ao invés dos demais existentes na cidade. Expliquei-lhe que trabalhara no ‘Jornal do Dia’, no Boa Esperança, que entrou em regime falimentar, e já tentara, sem êxito, vaga no “Diário de Cuiabá” (posteriormente, trabalhei nesse último, editando Cidades).
Sorrindo de forma maternal, olhar de quem compreende as aflições humanas, ela simplesmente respondeu: “Gostei de você, é determinado. Vou mandar contratá-lo. Já comece agora”. Não sei dizer exatamente qual foi minha reação de agradecimento, pasmo diante da generosidade confiante de quem poderia simplesmente me descartar. A professora fez um “ok” de entrevista terminada e saí rumo ao Departamento de Pessoal, feliz da vida.
Ali mesmo, no dia a dia desse jornal, pude assimilar melhor a dinâmica de trabalho da esposa do ex-governador Júlio José de Campos, eleito posteriormente a senador da República e conselheiro do Tribunal de Contas de MT. Isabel Campos transitava pelas salas do jornal e da emissora de rádio ali existente bem à vontade. Conversava com todos de igual pra igual, sem distinção de classe. Não poucas vezes, a flagrei dando gargalhadas ao ouvir casos das responsáveis pela limpeza do prédio. Sempre bem-humorada, de pronto para a vida, deduzi. Isso trouxe tristeza revoltosa quando o câncer a prostrou e conseguiu finalmente retirá-la do seio dos entes queridos, aos 66 anos. Nunca Isabel perdeu a consciência de tudo que sucedia, e por vezes exprimia felicidade resignada ao conversar sobre seu drama.
Também na TBO (TV Brasil Oeste), a professora Isabel Campos concedeu exemplos de fineza enérgica na administração da emissora. Sua sala nunca foi barreira para qualquer funcionário expor algo que necessitasse ou que dificultasse as funções profissionais da TBO. O interessante, percebi, é que ela sabia de pormenores dos bastidores da própria TBO e de sua co-irmã, a TV Rondon, à época afiliada da Manchete. Se a professora nos chamasse à sala, era porque tinha incumbência de reportagens. “Caprichem nas entrevistas e no texto”, instruía educadamente. Crítica, ela não poupava alfinetadas se alguém falhasse, ainda que as colocações fossem éticas. “Perdeu de entrevistar a pessoa mais importante do evento. Agora, nem dá pra voltar lá e pedir para refazerem a festa”, disse certa vez, em sorriso contido.
Ao fundar o Aeroclube de Várzea Grande (Aerovag), eu percebi também a extensão do apoio da família Campos. Primeiro, o então governador Jayme Campos assegurou a estrutura inicial da entidade, incluindo limpeza de área no aeroporto, móveis do escritório, combustível para buscar o avião argentino Aero-Boero em Maricá, Rio de Janeiro
Aliás, devo sempre ressaltar: a vinda do avião para se tornar instrumento prático nas aulas de voo só foi possível porque o então senador Júlio José de Campos conseguiu viabilizar a doação dessa aeronave em Brasília-DF junto ao antigo DAC – Departamento de Aviação Civil, atual ANAC. Se não fossem os irmãos Júlio e Jayme Campos, o aeroclube não teria se tornado algo concreto.
Já a professora Isabel Pinto de Campos, solícita, auxiliou na divulgação da publicidade em torno da implantação da escola civil de aviadores em Várzea Grande. Tornou-se, assim, presidente de Honra do AEROVAG, indicação minha quando assumi oficializei a fundação da entidade e assumi a presidência.
MARCO DE ATIVIDADES CULTURAIS E POLÍTICAS
A professora Isabel Campos começou a se projetar como figura de destaque político quando seu marido, Júlio José de Campos, assumiu uma cadeira no Legislativo Federal, década de 70. Ser esposa de deputado federal não significava cruzar os braços, era seu lema, e passou a trabalhar intensivamente para auxiliar na consolidação dos projetos revolucionários que transformaram Mato Grosso em celeiro desenvolvimentista.
A descoberta do câncer, inicialmente no ovário, não a desanimou, nem mesmo quando a doença atingiu outros órgãos. Lutadora pela vida, Isabel buscou tratamento em várias unidades hospitalares especializadas do País, a exemplo do Hospital Albert Einstein, em SP, onde se submeteu a cirurgias e sessões de radioterapia e quimioterapia. Nesse período, jamais deixou de externar esperanças de cura para os filhos e o esposo Júlio Campos, apesar de já saber, por experiência, que quase não havia chances.
Apesar de residir em Várzea Grande, cidade que amava declaradamente, Isabel Campos nasceu em Cuiabá no dia 09 de outubro de 1946, filha de Escolástica Coelho Pinto e José Pinto. Sua educação escolar básica aconteceu durante o período de internamento no Asilo e Orfanato Imaculada Conceição (Poconé) e no Colégio Imaculada Conceição, em Cáceres.
Novamente em Cuiabá, ela pôde concluir o curso Normal e Magistério no Colégio Coração de Jesus. Em seguida, sua paixão por literatura a levou a fazer o curso de Letras na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, um dos polos embrionários da atual Universidade Federal de Mato Grosso, que Isabel teve a honra de ser uma das fundadoras, além de desempenhar outras funções na instituição de ensino (conselheira e professora).
O interessante era seu poder visionário em relação à importância da Educação no contexto evolutivo das pessoas. Mesmo imbuída de sabedoria graduada no escalão universitário, a professora Isabel fundou uma escolinha vizinha ao pequeno negócio da família, denominando-a de Santa Isabel. Por ali desfilou um séquito de pessoas ansiosas em aprender, evoluir, e o futuro comprovou que isso tinha fundamento, pois muitos nomes do alunado dessa escolinha se tornaram personalidades respeitadas em setores diversos da sociedade.
Sempre pronta para aprender mais e mais, Isabel Campos concluiu mestrado na UnB ao defender tese de Literatura. Depois, assumiu a Secretaria Municipal de Educação na gestão do prefeito Júlio Campos, em Várzea Grande, ali nascendo atração mútua entre eles e consequente união matrimonial em 1975, da qual resultaram quatro rebentos: Júlio Neto, Sílvia, Laura e Consuelo.
O lado guerreiro da incansável professora Isabel Campos fez com que fosse figura ativa em todas as campanhas eleitorais do esposo, coordenando-as com maestria impecável.
Quando Júlio assumiu o Governo de Mato Grosso, a Primeira-Dama passou a administrar a Fundação de Promoção Social (Prosol), de 1983 a 86. Graças a ela e à carta-branca de trabalho que Júlio lhe concedeu na área social, vários rincões do Estado mudaram suas fisionomias paupérrimas para comunidades estruturadas.
Mas, conforme a própria professora Isabel Campos dizia abertamente, de todas as suas paixões, à exceção da família, pela qual tinha apego extraordinário, a área de Comunicação sempre foi sua menina dos olhos, o que resultou em sua participação em vários projetos nesse segmento, antes de assumir o comando das empresas familiares de TV, Rádio Industrial e jornal. Todos tiveram inédito avanço sob sua direção: o jornal, por exemplo, foi o primeiro do Estado a ser impresso pelo sistema off-set, a cores, enquanto a TBO ganhou destaque pelo pioneirismo em transmitir sinais por via satélite, em Mato Grosso.