PRIMEIRA PARTE
Antes da sessão fantasmagórica, propriamente dita, convém rápido preâmbulo para explicar como surgiu o bairro Novo Terceiro, em Cuiabá. Comunidade já tachada de violenta, hoje pacato núcleo residencial, situado a menos de 15 minutos do centro da capital mato-grossense.
Um dos boatos mais curiosos diz respeito ao local em que as primeiras casas de madeira do Novo Terceiro foram erguidas, dando início ao estruturado bairro atual: o terreno teria abrigado imenso cemitério. Conta-se que vários foram encontrados quando da construção das provisórias moradias.
Não há quem afirme categoricamente isso; no geral, muita gente acredita…
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O bairro Novo Terceiro, em Cuiabá, lateral à Avenida Miguel Sutil, surgiu em decorrência das enchentes da década de 70, quando o Rio Cuiabá inundou comunidades inteiras da capital. Casas de madeira foram levadas pelas águas, para desespero de quem conseguiu pouco na vida. As de alvenaria permaneceram parcialmente intactas, mas os pertences dos habitantes, submersos durante dias, foram destruídos.
As enchentes desalojaram, principalmente, grande número de moradores do Grande Terceiro, bairro interligado a outros núcleos; área de franco desnível nas proximidades do Dom Aquino, Campo Velho, etc…
Quem residia na parte mais alta, foi poupado. Porém, no plano inferior, paralelo à Avenida Carmindo de Campos, dezenas de famílias perderam tudo.
Ainda hoje, os cuiabanos recordam o desespero causado pelas enchentes. O nível das águas subiu ameaçador, de forma inédita, a ponto de bater à porta da Igreja Católica, próxima à divisa de Várzea Grande.
O rio é o divisor natural dos municípios desmembrados. Do lado oposto, em VG, ao longo da atual Avenida Alameda, estragos consideráveis também aconteceram.
Relatos apontam que, se acaso as chuvas não cessassem logo, apenas a torre da Igreja do Porto, conforme é conhecida, poderia ser vista naquela região. A Arca de Noé faria sucesso se aportasse para salvar tanta gente e seu patrimônio…
Há registros fotográficos de canoas abarrotadas de pertences e pessoas pelas ruas próximas ao Porto, transformadas, repentinamente, num grande lago turvo. Muitos levavam o que conseguiram resgatar; alguns, não tiveram tempo para isso…
MEDIDAS GOVERNAMENTAIS
Sem moradia, os flagelados foram remanejados para uma área próxima à Cooperativa Habitacional dos Militares, a cerca de três quilômetros dali. Emergencialmente, construiu-se uma série de barracos de madeira; moradias temporárias para abrigar quem perdeu tudo no Grande Terceiro. Surgia o Novo Terceiro…
O problema é que, a exemplo da cooperativa em questão, também a área cedida para a construção dos barracos comportou cemitério, segundo falatório perpétuo. É o que contam antigos moradores dos bairros siameses, apesar de socialmente distintos: enquanto a cooperativa (Coophamil) detém fama de núcleo habitacional de classe média, o Novo Terceiro se enquadra como comunidade carente, de classe baixa.
O Novo Terceiro, inclusive, desfrutou de fama de bairro violento durante anos, paralelamente ao Santa Isabel, seu vizinho. Ambos são considerados hoje bons lugares para se morar, independente de manter a mesma característica humilde.
No Novo Terceiro, visitantes ficam surpresos ao ver grupos de pessoas conversando nas calçadas, ou em resenhas festivas bairro afora, quando interditam as vias de acesso. As tradicionais festas religiosas da Paróquia Medianeira incrementam alegre movimentação no bairro. A de São Benedito é a mais famosa.
No geral, histórias de fantasmas à parte, o bairro é aconchegante e até certo ponto folclórico, em virtude de sua proximidade com o Rio Cuiabá. Algumas famílias ainda tiram o peixe de cada dia das águas do poluído manancial, igualmente alçado a clube aquático popular.
Por João Carlos de Queiroz, jornalista
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