Famílias relatam importância do Pró-família no orçamento doméstico

Três mulheres da região do Araguaia contam sua história e falam sobre a diferença que o benefício trouxe no cotidiano delas.
Caroline Rodrigues e José Medeiros | Gcom/MT – Com R$ 100 por mês, Jane Barros dos Reis, 26, garante a carne na mesa dos 5 filhos por 15 dias e Liene Teixeira Felix, 32, consegue comprar leite para os 4 filhos, que cria sozinha. Já a indígena Débora de Fátima Marimuguaeado, 36, mantém produtos de higiene pessoal, como pasta de dente e escovas, além de leite, achocolatado e o sonho de ficar na cidade enquanto os filhos estudam e caminham pela trajetória que os fará virar “doutores”.

Essas três mulheres moram na região do Araguaia e estão recebendo há mais de 6 meses o benefício do Pró-família. O programa é estadual e atende 18.028 famílias em 98% dos 141 municípios de Mato Grosso. Pessoas que muitas vezes ganham menos que a renda média per capita do estado – identificadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – no passado de R$ 1.247, e que todo dia 20 do mês têm R$ 100 para gastar no mercado com alimentos e produtos de higiene pessoal.

Em Barra do Garças, Jane prepara arroz e feijão para os filhos. Ela conta que sempre se sente “ruim” quando as crianças pedem para comer carne no dia em que ela não tem dinheiro para comprar. “Hoje, por exemplo, a mais velha não quis almoçar sem carne e a mais nova, comeu arroz branco”.

Segundo ela, a situação crítica teve um alívio em agosto do ano passado, quando ela passou a receber o Pró-família. Graças ao benefício, metade do mês tem a mistura garantida. “Quando chega o dia 20, eu sei que vai ter carne na mesa. Mas, eu faço economia. Compro ossinhos e frango, porque é mais barato, e salsinha, que as crianças pedem. O prato preferido delas é macarrão com salsicha”.

A mulher tem 5 filhos, sendo que as duas mais velhas, com 8 e 7 anos, são do mesmo pai. Um homem com quem ela casou em Tocantins. “A mais nova estava com dois meses quando ele me bateu muito. Meu ex-marido era 23 anos mais velho e muito ciumento. Minha família ficou com medo dele me matar e eu tive que sair fugida da cidade. Primeiro, fui para Brasília e depois acabei em Barra do Garças porque pensava que teria mais facilidade em um município menor. É difícil pagar aluguel e ainda alguém para cuidar dos filhos na capital do Brasil Central”.

Já em Barra, ela teve dois relacionamentos, sendo que teve um filho do primeiro e outro do segundo, que hoje está com 5 meses. Apenas o último companheiro dela ajuda com fraudas e comida às vezes, o restante da renda da família vem de doações. “Eu ganho um sacolão da prefeitura, mas vem só o básico. A carne, eu compro com o cartão Pró-família”.

Atualmente, Jane sonha em ter a casa própria porque mora de aluguel. No ano passado, ela teve a casa demolida porque estava construída no terreno de outra pessoa e o proprietário entrou na Justiça. “Eu paguei pelo lote. Foram R$ 6 mil, todo dinheiro que trouxe de Brasília. Depois, meu ex-marido me ajudou a construir. Mas, eles derrubaram e eu até fui procurar meus direitos, mas é muito difícil e eu desisti”.

O sonho da jovem é ter uma casa própria. “Eu já cheguei pagar R$ 700 de aluguel. Tirei comida da boca dos meus filhos para pagar. Agora, a única coisa que quero é ter meu canto e trabalhar para sustentar meus meninos. Já desisti de estudar. Acho que minha cabeça não funciona mais”.

Um trabalho – A diarista Liene Teixeira Felix não vê a hora do filho mais novo, hoje com 1 ano, completar a idade de ir para creche. Ela almeja ter um emprego fixo, com horas estabelecidas e carteira de trabalho assinada. “É muito difícil com filho pequeno. Às vezes não tenho com quem deixar as crianças e ninguém quer contratar uma pessoa que precisa sair no meio de serviço para socorrer as crianças que deixou em casa”.

O último emprego registrado dela foi em uma escola de idiomas e depois que saiu não teve outra oportunidade porque engravidou e o filho estava pequeno. Desde então, as finanças da família são incertas e dependem de uma série de variáveis, como: o cliente solicitar serviço e ter alguém para ficar com as crianças na data combinada.

Devido aos obstáculos, Liene precisa usar com sabedoria os poucos recursos adquiridos por meio de bicos e programas assistenciais. Com o dinheiro do Pró-família, por exemplo, ela compra leite, biscoito e fraudas. “Eu consigo manter o grosso, mas muitas vezes eu tive que dividir o pouco leite que tinha entre todos”.

Sonho de ascensão – A educação dos filhos motivou a indígena Débora de Fátima Marimuguaeado, 36, a mudar-se com a família para a cidade. Ela mora em General Carneiro e afirma que seus esforços têm apenas um objetivo: transformar as crianças em adultos corretos e “doutores”. “O pai deles sempre fala: – estudem. Não queremos que eles trabalhem no sol e na chuva. Queremos que sejam médicos, enfermeiros, professores ou engenheiros”.

Na opinião dela, a aldeia Merure, onde moravam, é muito boa porque lá as pessoas têm mais liberdade. Quando moravam no local, os filhos de Débora podiam andar para todo o lado, pescar e jogar bola à vontade. Sem risco de serem vítimas de violência.

O problema estava na escola, que não oferecia condições deles serem competitivos quando tiverem idade para entrar na universidade. “Falta professor e não é tão puxado como na cidade. Aqui eles são mais cobrados e podem fazer um vestibular”.

Desde que chegou a cidade, as dificuldades da família são muitas. Além das despesas que aumentaram, existem muitos obstáculos para integrar o mercado de trabalho. Um deles é a falta de estudo e o outro é a discriminação. “Aqui temos que pagar aluguel, água e luz. E, ainda tem o preconceito. É muito difícil as pessoas darem emprego para os índios. Mesmo assim, seguimos de cabeça erguida”.

Com o dinheiro do Pró-família, Débora diz que compra alimentos e produtos de higiene. Como não precisa gastar com estes itens, economiza o dinheiro e aplica em outras necessidades da família, como as despesas mensais e material escolar para as crianças.

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