No já longínquo dia 31 de outubro de 2012, Montes Claros perdeu uma de suas figuras emblemáticas na área de Medicina e política: doutor Moacir Lopes. O médico foi vitimado por parada cardiorrespiratória; perda que causou forte comoção social na cidade, pois doutor Moacir se enquadrava entre os clínicos mais queridos da cidade e Norte de Minas Gerais.
Formado pela UFMG, doutor Moacir oficializou matrimônio com Maria José Dias Lopes, considerada, na época, uma das mais belas e elegantes mulheres do Estado mineiro. O casal gerou cinco filhos, três homens e duas mulheres (Moacir Júnior, Paulo Lopes, José Alexandre, Raquel e Ana Vitória.
No exercício clínico, doutor Moacir logo ganhou notoriedade e admiração do povo norte-mineiro, pelo fato de jamais negar assistência aos humildes.
O atual Hospital Aroldo Tourinho, de Montes Claros-MG, foi construído na sua gestão de prefeito municipal, quando se chamava Hospital Municipal São Vicente de Paula. Os pobres tinham atendimento 100% gratuito nessa unidade. O que não acontece atualmente…
Reside aí um dos questionamentos dos montes-clarenses: o referido hospital deveria levar o nome do seu fundador e principal benfeitor de assistência médica aos humanos desassistidos de planos de Saúde, quando ainda não tínhamos o SUS.
Sem querer desmerecer o grande legado do médico Aroldo Tourinho, outro profissional respeitadíssimo nos tempos outrora, o antigo Hospital São Vicente de Paula deveria ter sido rebatizado com o nome do ex-prefeito Doutor Moacir Lopes.
Ali, determinado a salvar vidas, doutor Moacir Lopes realizou centenas de cirurgias gratuitamente. Tornou-se o queridinho dos pobres por ser igualmente humilde, apesar de possuir bens que poderiam tê-lo alçado à condição de rico.
Militância política
Doutor Moacir Lopes alternou sua paixão pela Medicina com ininterrupta militância política: foi eleito deputado estadual para a sétima legislatura (1971-1975), mas renunciou em 28 de janeiro de 1973 para assumir a Prefeitura de Montes Claros.
Também foi eleito deputado federal, assumindo, na sequência, a presidência da Fundação Rural Mineira, com sede em Belo Horizonte-MG. Tive o prazer de assessorá-lo várias vezes.
Doutor Moacir, conforme disse inicialmente, primava pela simplicidade. Mal chegava na casa das pessoas e já pedia café, sentando-se em banquinhos de madeira para prosear. Dava boas gargalhadas, ou escutava sério as confidências amigas.
Certa ocasião, em São Francisco, acompanhei-o numa maratona de consultas. Perto do meio-dia, atendeu uma mulher que aparentava quadro infeccioso resultante de aborto. Ele a questionou se provocara o aborto ou se foi espontâneo. O atendimento foi demorado, e mesmo aguardando numa sala próxima, sentimos o fétido odor da infecção vaginal.
Doutor Moacir enfatizou que aquele quadro se constituía em grave, e aconselhou urgente remoção da jovem paciente para uma unidade hospitalar. “Espero vocês lá amanhã cedo” (no Hospital São Vicente de Paula), disse à mãe da moça, após terminar a assepsia vaginal.
Depois de lavar as mãos, ele disse sentir fome, e o dono da casa onde realizava as consultas trouxe almoço. Fiquei pasmo ao vê-lo comendo bife de fígado com tanto apetite. Há pouco, suas mãos estavam untadas de sangue…
Homem bravo
A pequena estatura jamais se constituiu em menosprezo para todos temerem a fúria de doutor Moacir Lopes. Se contrariado, seus olhos flamejavam ira que nem os de papagaio.
Dizíamos na época respeitá-lo, e realmente respeitávamos, mas o temor das broncas do médico – a quem eu considerava meu parente – se proclamava acima disso. Quando adolescentes, bastava ouvir sua voz imperiosa nos chamando para todos tremermos nas bases.
– Vicheeee – É doutor Moacir! Agora, danou-se tudo! – dizíamos ao correr pela Praça da Matriz.
Uma outra qualidade sua era a de dizer na lata o que pensava de alguém, sem se importar de ser mal-interpretado. Uma vez, ao ser ameaçado por um fazendeiro do Jequitinhonha, doutor Maurício o acusou de ser malvado:
– Você tem aleijado muita gente, e alguns até andam de cadeira de rodas. Comigo, não, é diferente: já mato logo meus inimigos!
O fazendeiro não tirou o olho do revólver que doutor Moacir colocara na mesa antes de conversarem. Faltou pouco para tremer que nem vara verde. E o médico continuou dizendo, sem deixar de fitá-lo:
– Se quer ser piedoso, mate logo, não deixe ninguém sofrer. Basta eu perceber que tenho escorpião no meu pé para esmagá-lo de vez. O mal se corta pela raiz; e a vida de gente peçonhenta também!
Obs> A presente homenagem coincide com um acontecimento triste, na data de hoje (25.02): o falecimento da matriarca dos Lopes, esposa de doutor Moacir. O corpo está sendo translado para Montes Claros, velório que acontece amanhã.