Em participação na 13ª Bienal da União Nacional dos Estudantes (UNE), a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, afirmou hoje (3) que pretende desenvolver políticas de apoio aos estudantes negros e disse estar pleiteando R$ 100 milhões para os projetos desse primeiro ano. O orçamento da pasta ainda não está definido.
“A gente vai lutar para isso, se vamos conseguir, não sei. Mas somos a maioria da população, 54% dos brasileiros são negros. E muitos jovens periféricos precisam da nossa ajuda. Esse orçamento é o sonho, mas com o que tiver a gente vai trabalhar bem”, disse.
A ministra classificou as cotas raciais como a maior lei de reparação à população negra já implementada no país. Ao mesmo tempo, manifestou preocupação com a evasão de estudantes. “Jovens que não têm condições acabam deixando a universidade”, lamentou.
Segundo Anielle, a política de cotas raciais precisa estar acompanhada de medidas voltadas para a permanência. Ela afirmou que está nos planos do Ministério da Igualdade Racial discutir uma política de bolsas para estudantes negros e outras medidas de assistência estudantil.
Bienal
Considerado o maior festival estudantil da América Latina, a Bienal da UNE conta com uma programação de atividades culturais e debates sobre arte, educação, política e ciência. Anielle participou de uma mesa que discutiu a construção da identidade brasileira.
A ministra se emocionou com gritos de ordem dos estudantes em memória de sua irmã Marielle Franco, vereadora do Rio de Janeiro assassinada em 2018. As razões do crime até hoje não foram elucidadas. “Não sei porque mataram minha irmã, mas eu sei que quem teve a crueldade de encomendar o assassinato de uma mina preta não imaginava o tanto de barulho que a gente ia fazer”, disse.
Nascida no Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, Anielle também lembrou suas origens e contou que sua irmã era quem muitas vezes lhe levava para o treino de vôlei. Foi pelo esporte que ela ganhou aos 16 anos uma bolsa para estudar nos Estados Unidos. Ficou no país mais de 12 anos, onde cursou Jornalismo. De volta ao Brasil, se formou em Letras pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Com mestrado em relações etnicorraciais, Anielle é atualmente doutoranda em Linguística Aplicada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Com uma trajetória ligada à academia, ela avalia o impacto das cotas. “Na UERJ, eu tive apenas uma professora negra. Entre os alunos, éramos 5 em uma turma de 60. Hoje estamos ocupando lugares onde nossa presença foi historicamente negada”.
Democracia racial
Estudantes negras que participam da Bienal da UNE defenderam o debate como central para a pauta estudantil. Aline Dourado, aluna de Letras Vernáculas na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) em Vitória da Conquista (BA), considera que o Brasil ainda tem uma falsa democracia racial e que as políticas de emprego e renda devem visar uma igualdade. Para ela, as cotas são fundamentais.
“Cada vez que uma pessoa preta se forma na universidade é uma revolução na sua família. Mas tem que entrar e tem que permanecer. É muito importante ter políticas de assistência estudantil, para que as pessoas não abandonem os cursos. A sociedade brasileira avança quando as pessoas pretas avançam”, disse.
A estudante de ciências sociais da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Kariny Lopes, afirma que a luta da população negra é por dignidade. “O país é extremamente racista. E esse racismo muitas vezes nos priva de direitos básicos como o direito de ir e vir e o direito à vida. A gente às vezes não tem o direito de estar em um espaço educacional, em um espaço de lazer”, criticou.
*Colaborou Nanna Pôssa, repórter da TV Brasil.
Edição: Aline Leal