Ainda sobre o colega gorducho da Escola Normal…

(SEGUNDA PARTE)

Na primeira parte, falei sobre o dia em que, sob pressão de surra, fui obrigado, por colega gorducho, a comer um pacote de tamarindo. Ainda sinto náuseas ao recordar esse dia…

As malvadezas do dito cujo não pararam por aí: insensível aproveitador da fraqueza física de meninotes, ele voltou a aprontar comigo.

Por azar, o infeliz morava inclusive perto da minha casa, no bairro Roxo Verde, a metros do Colégio São José. Dali à Escola Normal, atrás da Praça Doutor Chaves, Matriz, era uma caminhada bem puxada…

Ir e voltar à escola implicava, portanto, quase numa maratona. Vez ou outra, nós (eu e o gordão) subíamos a Rua Belo Horizonte próximos um do outro. Eu fingia nem vê-lo, pois o maldito poderia interpretar isso como provocação; vivia na defensiva…

Mal deixei a escola num final de tarde, caminhando displicentemente pela calçada lateral à primeira casa de Montes Claros {já demolida}, senti minha orelha esquerda sendo agarrada violentamente por uma garra forte. No caso, a mão direita do gorducho malvadeza…

Tranquilo na sua impunidade torturadora, ele se posicionou a meu lado para empreendermos a longa marcha até o bairro Roxo Verde. E foi aplicando puxões sucessivos na orelha prisioneira, a cada quarteirão, sem ligar para meus reclames de dor.

Ninguém me socorreu, infelizmente. Creio que devem ter pensado ser meu irmão mais velho…

O insensível torturador só me largou {e saiu correndo} ao ver minha mãe se aproximando do portãozinho da casa, quando a chamei choroso. Ela nem percebeu o quanto eu sofri nas mãos daquele carrasco…

Feito um pateta, fiquei caladinho em casa acerca dessas covardias que ele praticava quase todos os dias comigo, seja entremeando cascudos ou palavras ofensivas. Não poucas vezes, de surpresa, ele me passou calços no corredor, derrubando-me sem piedade.

Nunca me queixei também com a professora Cleonice, tampouco com meus pais. Temia que meu pai me mandasse enfrentá-lo, sob pena de apanhar em casa se fugisse da briga. Melhor ficar caladinho… Alguns coleguinhas confessaram passar por algo idêntico em suas mãos.

Hoje, penso que fui mesmo um completo idiota: devia ter dedurado esse brutamontes, ou armado algo para me vingar de suas covardias! Deus nos instrui para perdoarmos quem nos magoou, mas eu sonho exatamente o contrário: esfolá-lo vivo!

Por João Carlos de Queiroz, jornalista

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