A velha bicicleta de ‘Carlão Rapadura’…
1969 – Época em que comecei a cobiçar uma bicicleta arcaica, de cano duplo, que meu saudoso pai saracoteava por toda Montes Claros-MG. Ao assumir a gerência da Transportadora Expresso Mineiro em 1971, empresa que disponibilizou caminhão Chevrolet para as entregas locais, Carlão Queiroz encostou essa bicicleta de vez.
Dali em diante, limitou-se a engraxá-la cuidadosamente, guardando-a num quartinho do quintal, seu reduto de utilidades múltiplas: ali havia ferramentas diversas, armas, máquinas fotográficas, etc. Conseguir a chave desse quartinho era difícil…
A bicicleta, conforme sinalizei, não tinha nenhum atrativo: tratava-se de uma magrela comum, cor verde desbotado, pés de vela (suporte de pedais) afixados por pinos. Volta e meia eles afrouxavam, e aí era preciso rebatê-los firmemente; caso contrário, corríamos risco de esmagar os testículos, no cano central. Muita dor, aconteceu comigo…
Mesmo sendo tão simplória, a ultrapassada magrela foi meu principal veículo de transporte escolar durante anos. Tenho nítidas recordações do suave balanço da cadeirinha, presa à garupa, quando meu pai me levava à distante Escola Normal, na Avenida Mestra Fininha. De quebra, à noite, ainda transportava minha mãe ao bairro Morrinhos,
Essa bicicleta cumpriu função louvável de me transportar também ao Grupo Quita Pereira, na Vila Ipê, educandário infantil pertinho de nossa casa, na Rua Cravina, bairro Edgar Pereira.
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Ao perceber o descarte educado da velha bicicleta, meus olhos estatelaram desejo de me tornar seu novo proprietário. Só de ouvir meus pedidos contínuos, meu velho impunha expressão carrancuda, mostrando-se indignado por tanta insistência.
Meu mano mais velho tinha bicicleta, mas de há muito estava de olho em dirigir o Chevrolet, sempre encostado no nosso portão. Bastou um descuido do velho e ele saiu dirigindo pelo bairro Edgar Pereira, para terminar dentro de córrego de dejetos da fábrica dos Irmãos Pereira. Simplesmente, não conseguiu finalizar a curva…
Ainda não sei, até hoje, como Zé Antônio não levou boas cintadas, pois meu pai quase não acreditou quando foram chamá-lo na empresa para retirar o Chevrolet do córrego. O caminhão ficou atravessado na principal rua do bairro. A custo, auxiliado por caminhonete, conseguiram puxá-lo pra fora.
– Ainda bem que não estragou nada – suspirou meu velho ao acionar o motor e sair firme, rumo à Expresso Mineiro. Doravante, ao cumprir expediente, o caminhão passou a ficar estacionado ali.
Aproveitei essa deixa para pedir, mais uma vez, que usasse a bicicleta, prometendo cuidar bem dela. “Pode pegar, desde que ande com cuidado por aí”, ouvi emocionado.
A partir desse dia, a magrela se tornou minha companheira de idas e vindas à escola e outros lugares. Principalmente, bons passeios na região, Cedro, Lapa Grande, etc., incluindo esticadas até Bocaiúva, cidade em que residem meus parentes paternos.
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