Contos mineiros de Afonso Celso de Magalhães Ferreira

Escritor mineiro, natural de Montes Claros, desenvolveu um estilo contista bem especial. O também economista Afonso reside em Brasília-DF. Mas mantém as lembranças dos rincões do sertão norte-mineiro bem vívidas...

A VACA QUE NUM FOI PRO BREJO

Escuro que tava, cor de noite, o barulho ascendeu desdilá, no acurvadado do caminho, um mais pracá do Atai do Joca, nas anca do riverde.
Assuntei c’as oreia impé, vê se ruído aumentava de microfone, mas nada que nada. Voltei pro bico do café e aroma do fumo.

Meus uvido depurou um arrastar de sapato botina, que foi tomando volume de chegada, até que parô na porta da porteira, e uma voz ingasgada chamou:
– Seu Nem!
Rispundi que se achegasse, e no instante que Zezé chegou cum bule de café novo, inquiri mais caneca.
O home abriu a porteirinha e se aprumou do meu lado, no dibaixo da janela da sala, de onde vinha a luz minguada do candiêro.
– ‘Noite – Disse ele, oiando prá mim cum jeito mei que discunfiado.
Inchi a caneca cum café fumegante e entreguei pr’ele.
– Que devo a visita do amigo? – reassendendo o cigarro. – O amigo aceita? – Ofereci.
Ele voltiô o agradecimento e disse me cunhecê de vista e nome.
Oiei pr’ele e pircibi um afobarimento acontinuado da respiração, e uns oi isbutucado de medo pavor. Puxei o chero na averiguança de sujeira, mas foi só. Tava era que limpo. Bosta num tinha.

– O amigo, puracauso, viu assombro de aparição?
Ele inguliu o café e baixou resposta: – Das grande.
Um riso de gozo brotou na minha cara, e mei que discontente ele prussiguiu a fala.
– Tava eu vino no encontro do amigo, mode imprego tô percurando. Bem iantes, no salão de bar em Pires e Albuquerque, inquiri trabai e me falaro do sinhô, impregadô na bondade e no justo.  Siguino o orientado, peguei istrada, e no adiante do introncamento, esse… do camim ataiado…
– Atai do Joca.
-?
– Pois num é!? Batizaram esse nome adispois qu’ium primo meu, de nome João do Cambão, s’intrumeteu pr’esse camin, faiz uns ano. Viã ele já nos manto da noite, cum assobiu de música nos beiço e um cigarro no alicate dos dedo, quan’o se apercebeu uns passo graúdo vino pur d’itrás… Desses de história de assombro de boi tatá que se ouve em noite de lua e quentura de fugão de lenha. Arregalou os sói e os cabelo do braço suspendeu de ispim, inguanto os passo continuô se achegano e ele arresolveu respondê as perna em  carrera de sumiço. O barui continuô no seu trasero, junto cum assoprar de respiração, fazeno que o primo intendesse que num caricia só de carreira, mais era de corage, pois a coisa num disgrudava dele. Continuô nesse batidão de medo ou valentia, inté arresolvê calmá a curriria, e cum zoio virado pru riba dos ombro, procurou pela parição, e ela, colada de carrapato que tava em suas calça e botina. Controlô a resfolegação o mais que pode, e no continuado dos passo siguiu… e siguido foi até as portas dessa casa, entrando em palvoroço de coração e sujo de calça.
– Pois num foi…

– Foi.  … bem no quase disso. No quase foi, no todo não.

No gozo da prosa e café e pito, inquiro licença pra mijo e, nas volta do passo, banco, bule e caneca encontro só. Cadê ele?

No calmo do sumiço, uma zuada vino do camin de fora bole c’as concha da miã orea, e num é que meus oi vê – oi qui essa terra há de cume, se tô mintino – uma vaca oiando pra mim cuns zoi librinado, mei que mangano da minha pessoa, e cum riso na cara, desse tamanho. – Discunjuro.

E ela desceu pelo camin, gargaiando de mim ou sei lá quem.
Discunjuro cruz in credo três vez.

AFOGADO EM PERFUME E ABRAÇO

Foi nos anos de começo dos setenta, três, se a memória num derrapa, quatro pra amarrar a correção. Fomos derramado da velha Kombi nas varanda da Palhoça, eu mais três, se não quatro, em busca de braço e perfume das meninas das ruas Tupinambás, Casimiro de Abreu e outras tantas. Ruas de infinita mirage, de os ói num derrapar nem um poquim em aba de isquina, ou eira de teiado; de só mostrar mureta e banco de apreciar conversa e namoro.

E nessa garantia de braço e perfume, cuns uvido bebendo as cantoria vindo das frança, é que fui conhecer os macio e cheiro da menina Cândida, morena de cabelo e cor e ôio. E foi nos balanço dos passo e abraço, de beiço grudado nas concha da oreia, que de prosa vai e vem, inquiri um namoro dos mais manso e moleque. No adispois do aceite, ficamo ali no convívio do aconchego de corpo e dança, resmungano as prosa de menino e moça, no colado dos rosto, e no morno das luz da casa de dança e boate. De quando em vez, cum coração atrapaiando os passo da música, os pé, em aflição de desorde, ficava maniado em subir pur riba dos dela, e a vergonha imbruiava as palavra e a cara.

Nos adiante assim foi os dias que chegava e ía. Era a noite caí e a função em balcão de farmácia acabá, rumava eu mais o coração pros Funcionário, em caminhada de minutos muito, mais suó. Repousava eu nas noite dos dia todo, mais gravador Aiko na sabonetera do sovaco, em passo de pé nas ruas de pó, pedra e cascai. E nas ponta de calçada, quando em grupo, ou nos duro do banco em porta de casa, quando sós, proseava em fala de moço minino e ouvido de música. Que mais num propunha se não um beijo pedido e num cunsiguido, nem no pouco e nem no todo do tempo de namoro.

No tudo das lembrança e no hoje, somente esse beijo e rua ficaro, um tanto no quanto mais diferente.

SÃO PEDRO, CADÊ MEU ANJO?

Foi qui’aquele dia chegou de azinzentado e friorento, derramando da cama todo o povinho do Largo da Matriz. Morador dali, na aba da orelha esquerda da igreja, um tal de Diamantino do Serro displantô suas perna para fora dos colchão e coberta, e um rangido de ronco brotou das dobradiças do joelho. Fincou o tronco de jequitibá por cima das gaias de bananeira e as molas da perna vergô. No acudimento dos grito, pontou de pronto Don’Ana do Rego e Serro ainda c’us copo e bule na mão. De requerimento assoprado nos rodapé da oreia,  num pé foi e no outro pé voltou com maleta de médico e pessoa de médico, o Dr. Lopes do Moacir. No atendimento e diagnósto da consulta, receita o Dr. Lopes descanso de cadeira e cama, e muita massagem, com os benefícios do revigorante Óleo de Mutamba e Catuaba. E nas concha da oreia um recomendativo dos mais recomendado: “Em mãos de menina moça é tiro e queda, Diamantino… é tiro e queda…e tu vais ficar novo de menino.”
Diamantino, ainda no quente da receita, recomenda o menino neto, Davi de Sonno e Serro, buscar em balcão da Farmácia Central 3 garrafas do bálsamo, e lá foi ele mais o óleo pras mãos e braços da menina da casa de porta aberta, Iracema Beija-Flor.
Porta e janela trancada, deita Diamantino nos gozo de cueca e mais nada, cuns’oi fechado e pensamento desavergonhado. De mãos lubrificadas com meio litro do óleo, Iracema abraça de macio o dedão do pé do cliente, que arrota um kilo de humm, e a cada nova laçada de mão, mais humm é derramado. Da testa da canela e batata da perna, subindo até as costa da coxa, Diamantino já incumenda as passage pros gozo das núve do céu. Foi as mão da moça encontrar o suvaco das pernas, Diamantino, já em porta de São Pedro, disufoca o grito e pede posada.

– São Pedo, cadê meu anjo?

affons & ffeh

affonsofferreira@yahoo.com.br

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