CONTO – QUANTO CUSTA UMA TAPIOCA?

Conto dois -Passeios

 

“O que tem aí, moça”?

A jovem gentil me responde, “Fécula de mandioca, coco e queijo”, “a nossa tradicional tapioca”.

“Queijo”? Sim,ela me responde “um punhado de mozzarella”.
Olho, e dou um sorriso, para aqueles lindos bijus recheados, a nossa “TradicionalTapioca” com queijo Italiano, “coisas da modernidade globalizada”, como aprendemos a dizer nestes novos tempos em Cuiabá.

Em um tabuleiro, estavam enfileiradas, todas iguais, branquinhas, envolvida em um saquinho, daqueles, tipo “cachorro quente”, ali, ao meu alcance, e oferecidas de forma simples, pratica e prontas, em um belo dia, ao entardecer em uma movimentada Rua do Recife.

Tapioca é preparada com recheios deliciosos. Inclusive doces

Pego uma e como, deliciosa, quentinha, com um aroma tão agradável! Sabor de Nordeste, momento único e maravilhoso, e ofereço aos dois pernambucanos que me acompanhavam: “Comam” – eles sorriem. “Aproveite chefe”, diz o amigo mais jovem, e aproveito, pedindo mais três pra viagem”. Em minha terra só em feiras, e em poucas, temos tapiocas e todos os tipos de recheio. Todas “tradicionais”.

A “Tradicional Tapioca”, com variados recheios, e com queijo mussarela, qual a diferença?Muitos comem a famosa “Pamonha com Queijo”, e nem percebem se o queijo é italiano ou das Minas Gerais, ou se as “milhosas” são feitas em Goiás. Isso é tradicional, ou não?

A tradição, às vezes, vem da necessidade, das dificuldades, e da cultura popular. Herança adquirida durante toda uma vida, e passada a futuras gerações de forma simples e vivenciada, poucas são por escritos.
Voltamos às “Tradicionais Tapiocas”. No Recife, elas são comuns, assim como pra eles não há café da manhã sem “Cuscuz” com acompanhamentos, ou não. Porém, até que ponto é tão tradicional? Ou será uma necessidade proveniente da realidade de um povo sofrido e moldado nas lutas do dia a dia, sendo assim, coisas para matar a fome?

Os meus olhos correm ao largo, vejo, o mar, coisa rica, e nesse momento em minha mente vem à lembrança, o encontros das águas e as nossas “cachoeiras” em pleno cerrado brasileiro. Também somos privilegiados, mesmo que momentaneamente esquecidos…

A riqueza brasileira se encontra no eixo “Sul, Sudeste”, as outras regiões, por vezes, são deixadas à parte, marginalizadas. Na verdade, as melhores condições estão ali, na rota do turismo, no diferente Brasil. Não podemos deixar de verificar que nem todos têm condições, mesmo que façam os seus projetos de participarem de grandes atividades ao dizer que todos são iguais, e ignorem a realidade a um palmo de sua própria face…

Comendo outra “Tradicional Tapioca” da sacola, daquelas “pra viagem”, vejo uns jovens descalços correndo na praia; muitos nascem e crescem, morrem aqui, neste paraíso, e muitos têm em uma única e “Tradicional Tapioca” o seu alimento de todo um dia. Porém, mostram uma alegria e felicidade contagiantes, que não se vê em grandes cidades de construções exuberantes. Aqui se vive liberdade!

Vontade de gritar, de dizer como e fácil e fazer a “Tradicional Tapioca” – só “Fécula de mandioca, coco e queijo”, podendo usar o tal queijo italiano mussarela, a massa e a mesma, com pequenas mudanças no recheio, a receita é de todos, livre, a variação é apenas na forma de fazê-la, podem usar de criatividade à vontade…

A “Tradicional Tapioca” é do nordeste, mas é apreciada em todo o Brasil. Já possui hoje características regionais ou locais, sabor da terra. A “Tradicional Tapioca” caiu no gosto popular, não é verdade? Um número maior de pessoas pode experimentar e se deliciar.

No nordeste, umas 70 mil pessoas as degustam, podendo ser mais. Agora, quem sabe, com a regionalização e gosto locais, e levados a todos os cantos do Brasil do esquecimento, dois milhões de pessoas possam apreciá-la. Seria ótimo, quem tiver competência se estabeleça.

Pego a carteira para pagar a conta, lembrando que tenho que partir num voo, logo mais à noite. Retiro uma nota de R$ 20,00, dou meia volta e inicio a andar. Um puxão em meu braço e ouço voz suave em minhas costas: “Ei moço, tem troco”. Viro-me e vejo o sorriso, e nas mãos da jovem a devolução do troco, R$ 12,00. Pego, agradeço, fico meio sem jeito, despeço-me e, desejando à jovem, boas vendas de suas “Tradicionais Tapiocas”.

Andando. Fico um minuto calado, só analisando, e em meu rosto o tradicional sorriso de boboca. Em Cuiabá, uma tapioca é, em média, R$ 5,00, já comi em São Paulo tapiocas “não Tradicionais” a R$ 8,00 e R$ 10,00 .

Bem, ainda uso “óculos escuros” com grau, não enxergo muito bem com a claridade, sendo estes uma necessidade. Agora não uso mais “chapelão escoteiro”, não vejo nisso o que os outros veem (“tradição”), nada contra quem os usa. Na verdade, gosto das questões regionais; imagino a diversidade cultural brasileira dos “chapéus”, uma tropa escoteira com chapéu de cangaceiro, ou de vaqueiro, de gaúcho… Lindo mesmo são os chapéu pantaneiros!

Antes que finalize e esqueça, nas ruas de Recife, Pernambuco, o preço da “Tradicional Tapioca” é R$ 2,00. Agora, quero ver “o cabra macho” que se habilita a ir lá e queira tentar mudar a cultura desse povo…

Chefe Everson Sanchez – DCC
Coordenador Geral da “CBE”
P.S.: Os Contos da série “Passeios” são uma obra de ficção; qualquer semelhança é mera coincidência.Em breve o conto Três Passeios, “Águas Salgadas”. Tributo aos escoteiros florestais d Maceió das Alagoas.

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